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A cultura de doação no Brasil ainda é bastante incipiente. Poucos brasileiros tem o hábito de doar, seja seu tempo ou dinheiro para ONGs. A filantropia, no entanto, é muito importante para o fortalecimento da sociedade civil, uma vez que ONGs auxiliam grupos minoritários, a diversidade e o controle social.  Movimentos, no entanto, tem buscado mudar esse cenário, promovendo a cultura de doação no Brasil.

Um bom exemplo é a iniciativa #diadedoar, uma plataforma online voltada para promover uma campanha global de doação que acontecerá no dia 2 de dezembro. Doar, de acordo com essa proposta, não significa apenas transferir dinheiro a alguém ou a alguma entidade. A campanha fala em doação de tempo, de sangue, de órgãos, de mantimentos, de agasalhos, entre outros recursos materiais ou intangíveis.

Além de facilitar processos de doação, o site promove a cultura da solidariedade ao colocar em contato pessoas e organizações que exercem sua responsabilidade social pessoal a partir da filantropia e organizações sociais – muitas vezes instituições de base comunitária que dependem de doações para cumprir sua missão.

A campanha surgiu nos Estados Unidos, com o GivingTuesday, em resposta às massivas ações de vendas que acabam promovendo o sentido de consumismo durante as liquidações do Black Friday e Cyber Monday. No Brasil, a primeira experiência aconteceu em 2013, mas a data não foi alinhada à campanha global. Neste ano, tudo acontecerá simultaneamente.

Tem uma diferença entre a iniciativa norte-americana e a brasileira: lá, o foco é a doação de dinheiro; aqui, também queremos incentivar outros tipos de doação, como a de tempo, por meio de voluntariado”, diz Marcelo Estraviz, presidente do Instituto Doar, membro do Movimento por uma Cultura de Doação e um dos coordenadores do #diadedoar.

Campanha no Brasil e no mundo

Desde a criação do GivingTuesday a campanha não para de crescer. Em pouco tempo a ideia se espalhou pelo mundo e, hoje, o #diadedoar acontece em diversos países como Argentina, Chile, Colômbia, Austrália e México. No site é possível conhecer a lista completa de nações participantes do movimento.

Assim como já acontece nos EUA, na América Latina, na Espanha, na Austrália, no Canadá, em Cingapura, em Israel, no México e no Reino Unido, queremos que 2 de dezembro seja a celebração também da generosidade do brasileiro”, diz João Paulo Vergueiro, presidente da ABCR – Associação Brasileira de Captadores de Recursos e um dos coordenadores do movimento.

No Brasil, uma lista de organizações com consolidado trabalho de filantropia fazem parte da iniciativa. Entre elas, o Instituto Saúde e Sustentabilidade, que atua com mobilização social e construção de políticas públicas ligadas à área da saúde, a organização TETO, uma entidade com atuação na América Latina e Caribe na construção de moradias para populações em situação de risco, e APAES de todo o Brasil.

Histórias que inspiram

Filantropos e interessados em doar também encontram no site um área para compartilhar histórias e inspirar atitudes. Na sessão “Conte sua história” é possível acessar relatos de pessoas envolvidas com práticas sociais. A ideia é dar visibilidade para boas histórias e facilitar processos de troca de ideias.

Há dois anos eu doei para a ONG Amigos do Bem. E nos meses seguintes, eu levei meus amigos ciclistas para doar também. A partir daí, criei um grupo voluntário. A cada dois meses, escolhemos uma ONG, arrecadamos o que ela precisa e num dia marcado levamos tudo de bike. As pessoas querem ajudar mas não sabem como. E a partir desse trabalho que realizo, crio uma ponte entre quem quer ajudar e quem precisa, mas não perdemos o foco da nossa paixão, a bicicleta”, explica Lilian Frazão, criadora do grupo Pedal Voluntário.

Lilian conseguiu unir duas coisas: sua paixão por pedalar e a prática da doação. Para ela, além de contribuir com organizações que realizam um importante papel social, a atitude também faz bem para o doador. “Doar é ser menos egoísta, é entender nosso papel na sociedade, é fazer o bem para alguém.”

Para aderir ao #diadedoar, basta entrar no site, cadastrar a organização e descrever qual iniciativa será feita no 2 de dezembro. Famílias, estudantes, empresas e organizações da sociedade civil podem organizar a atividade e compartilhá-la no site e nas redes sociais com a hashtag #diadedoar.

Assista ao vídeo do #diadedoar:

[youtube=http://www.youtube.com/watch?v=8033r94OxNI&feature=youtu.be]

Entrevista

Confira na íntegra o bate-papo com Marcelo Estraviz, presidente do Instituto Doar.

redeGIFE – Qual o objetivo central do site #diadedoar, que acaba de ser lançado?

Marcelo Estraviz – O site é a versão 2014 de uma iniciativa que começou no ano passado, no dia 30 de novembro de 2013, quando lançamos o dia de doar junto às 500 organizações presentes na Feira ONG Brasil. Este ano, em parceria com uma iniciativa global que envolve a Fundação das Nações Unidas, fazemos parte de uma família de iniciativas que querem inspirar pessoas, organizações e empresas a realizarem doações em um dia determinado (2 de dezembro). Essa atitude, em um único dia, objetiva mostrar força, e assim, isso inspirará ações todos os demais dias do ano.

redeGIFE – Como organizações sociais podem aderir à iniciativa?

Marcelo Estraviz – O site tem o intuito de que as organizações se cadastrem, explicando o que farão no dia. Também tem o objetivo de inspirar umas às outras. Há um conjunto de ideias, ferramentas e atividades já realizadas. Todo o foco é para que organizações, empresas e pessoas se inspirem e realizem ações. É uma campanha eminentemente prática.

redeGIFE – Como empresas, institutos e fundações podem contribuir para promover a cultura da doação no Brasil?

Marcelo Estraviz – Pelo exemplo. Nosso objetivo é que possamos deixar o discurso politicamente correto de lado e possamos dar o exemplo, com nosso mutirão pela pintura da escola, com a foto mostrando nossa doação de sangue, com o compartilhamento de nossa confirmação da doação no site de crowdfunding, com o vídeo com os voluntários dando aula de inglês. Essas ações são o melhor discurso para ampliarmos a cultura de doação no Brasil. Vamos doar exemplos.

redeGIFE – A prática da solidariedade é uma cultura já instituída no Brasil? Que diferenças e similaridades podemos apontar entre a nossa realidade e a americana?

Marcelo Estraviz – Os EUA tem uma cultura arraigada nos seus 500 anos de história, desde a época dos colonos, quando, juntos, construiam seus postos de saúde, igrejas e escolas. Essa forte cultura comunitária está espelhada hoje no cotidiano do americano médio. Nossa história é diferente. Nossos primeiros habitantes não vieram aqui colonizar o país mas sim extrair riquezas e voltar para seus países. Não havia sentido comunitário a não ser por um punhado de freiras das Santas Casas. Nosso modelo então é mais viciado na esmola do que na construção coletiva de um sentido comunitário. Ainda assim, tivemos uma forte guinada em 30 anos, quando deixamos de ser um país de terceiro mundo, e recebíamos vultosas “esmolas” de centenas de milhares de euros da cooperação internacional e passamos a ser, ainda que por enquanto de forma incipiente, exportadores de doações. Uma ONG como a Médicos sem Fronteiras tem hoje 175 mil doadores mensais, que decidem doar para iniciativas na África. Tudo isso aconteceu em 30 anos. A mesma velocidade com que centenas de ONGs se desenvolveram na Europa e Canadá (Greenpeace, Care, Médicos sem Fronteiras, ActionAid). Hoje somos um país globalizado, quando olhamos essas organizações. Somos 35 milhões de doadores, doamos, como pessoas físicas, 5 bilhões de reais anualmente (sem quase nenhum incentivo). Nossos objetivos? Dobrar isso. Acho que ações como o dia de doar e outras iniciativas que envolvam a ampliação na cultura de doação devem ter metas de, em um prazo de 5 anos, por exemplo, chegarmos a 10 bilhões de reais anuais. 70 milhões de brasileiros doando. Achamos isso absolutamente factível.

redeGIFE – Qual a expectativa para a realização do #GivingTuesday neste ano?

Marcelo Estraviz – Queremos ter 1000 organizações cadastradas com ações concretas para o dia. 25 cidades com equipes voluntárias engajadas e pelo menos 200 embaixadores de redes sociais (gente que ajuda a divulgar a iniciativa). São 20 países que atuarão em conjunto, no mesmo dia. Então estamos também prevendo ações conjuntas, com ONGs que tem escritórios em diversos países, assim como empresas multinacionais. Temos algumas surpresas também. Mas isso melhor falarmos mais perto do dia [risos].

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