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via: Coluna Rodrigo Ratier no uol.com.br

 

Desde antes do início de seu mandato, o presidente Jair Bolsonaro elegeu as organizações não-governamentais (ONGs) como um alvo preferencial de sua metralhadora giratória. Às vésperas do segundo turno, em discurso transmitido a militantes na avenida Paulista, prometeu acabar com toda forma de ativismo. Já no poder, pôs em xeque o recebimento de recursos ao criticar ambientalistas; sem provas, acusou organizações de queimarem a Amazônia; criticou um suposto silêncio — que não houve — em relação ao óleo nas praias do Nordeste; debochou de militantes ao afirmar que ficam “fumando um cigarrinho a noite toda”. A lista é longa e, como Bolsonaro se alimenta do conflito, não deve parar de crescer.

A pandemia tem mostrado que essa imagem é distorcida. As ONGs têm se colocado na linha de frente de ações emergenciais, da distribuição de alimentos, máscaras e kits de higiene à mentoria para pequenos negócios. “Com ações concretas, estamos mais legitimados para sermos ouvidos pela sociedade”, opina Mauri Cruz, membro da Diretoria Executiva da Abong (Associação Brasileira de ONGs). Adriana Barbosa, empreendedora social à frente da Feira Preta, voltada para negócios da cultura negra, vai além.

Sem a presença das ONGs e seu conhecimento, ninguém pode falar que está fazendo filantropia, sobretudo em territórios periféricos.

Adriana Barbosa

No caso do novo coronavírus, Mauri relata o surgimento dos chamados “comitês de solidariedade”, reuniões de entidades que voltaram baterias em ações emergenciais contra a pandemia. “No país, estimamos a criação de algo entre 3 mil e 4 mil comitês, responsáveis pela distribuição de milhões de cestas básicas”, afirma.

Também ganhou força o papel de meio-campo entre empresas e comunidades. Adriana destaca o conhecimento dos territórios como característica fundamental em momentos de crise. “Uma empresa não consegue fazer doação de cesta básica sozinha. Precisa saber onde, com quem falar e a qual logística recorrer para chegar lá. São as ONGs que têm esse recorte”. Para Mauri, esse papel está no DNA de muitas entidades. “Na verdade, as organizações da sociedade civil — denominação legal das ONGs — sempre atuaram na ponta, ligadas a mecanismos autônomos de solidariedade.”

A retomada do protagonismo deriva, em boa parte, da fragilidade do poder público. Mauri aponta a Emenda Constitucional 95, que instituiu o teto de gastos, como uma das responsáveis pelo sucateamento dos serviços de assistência social. “Em muitos municípios, a área foi incorporada à saúde, educação ou simplesmente desapareceu. Os bancos de alimentos se tornaram raros. A emenda tirou dinheiro das políticas rotineiras de manutenção de serviços básicos”, argumenta. Mesmo as ações emergenciais são objeto de crítica, segundo Adriana. “No caso do socorro aos microempreendedores, um dos critérios do pacote do governo é não ter o nome sujo. Tem pessoas que não pagam imposto há dois meses. Como acessar o recurso para a pandemia se em função dela você está em débito?”, questiona.

Se a parceria para a ajuda emergencial tem dados bons frutos, outras ações ainda dependem de ajustes. Adriana relata a dificuldade de convencer investidores a destinar uma parte dos recursos doados para que as entidades possam manter sua própria estrutura. Também estão fora do radar demandas recorrentes (“cesta básica precisa ser todo mês”, ela afirma) ou de necessidades menos visíveis.

Mas há avanços. “No caso das empreendedoras negras, estamos fechando com um financiador para ajudar com tíquete refeição, crédito no no celular, crédito para impulsionamento digital e programas de saúde mental”, diz Adriana. Um recomeço de conversa num diálogo interrompido pela polarização política que varreu o Brasil.

“Com a mobilização por pautas concretas, não carimbadas à esquerda ou à direita, conseguimos trazer mais gente para a ação, inclusive uma parcela da população que embarcou no discurso antissistema. O auxílio na dor cria vínculos”, finaliza Mauri.

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