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Cidades pequenas, localizadas entre os latifúndios da monocultura banhada em venenos, apresentam índices de doenças e mortes bem acima das médias estaduais

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Agrotóxicos usados na monocultura da cana em SP elevam índices de adoecimento entre os agricultores e toda a população

São Paulo – Cidades médias e pequenas do interior do estado de São Paulo, localizadas em meio a grandes extensões de terra com monocultura da cana e banana, entre outras, apresentam taxas de incidência de malformações congênitas e diversos tipos de câncer acima da média estadual.

Em Ribeirão Corrente, na região de Franca, o índice de malformações é 26 casos para grupos de 100 mil nascidos vivos – mais de três vezes maior que a do estado, que é de 8.2. Em Sandovalina, na região do Pontal do Paranapanema, onde há ocupação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), o índice é 21. Na cidade de São Paulo, totalmente urbanizada, a taxa é de 9.5.

“Em Franca, uma mulher que engravida tem 50% a mais de chances de ter um filho com malformação do que uma moradora de Cubatão, por exemplo. E nem precisa ser agricultura. Está comprovado por estudos que em 70% dos casos de malformação congênita as causas são ambientais”, diz o defensor público Marcelo Novaes, da Defensoria Pública do Estado de São Paulo em Santo André, no ABC Paulista.

A incidência de câncer também é alta na zona rural. Em Bento de Abreu, na região de Araçatuba, há 18 óbitos por câncer cerebral para cada 100 mil habitantes. A taxa estadual é 6.6. “Essas cidades pequenas são fronteira entre o urbano e rural. Você sai da igreja matriz e já está numa plantação de cana, onde há pulverização aérea ou por tratores”, diz o defensor.

Ainda segundo ele, as taxa de mortes causadas por câncer de fígado é de 6.94 por 100 mil pessoas no estado, de 7.43 na capital paulista e de 20 em Turmalina, na região de São José do Rio Preto. Quase três vezes mais. “São cidades pequenas, com menos de 20 mil habitantes. Temos uma tragédia no interior paulista. As pessoas estão morrendo pelo veneno. Se antes se fazia excursão para o Paraguai, para compra de muamba, ou para Aparecida, para rezar na catedral, hoje se faz aos centros oncológicos”, compara.

Segundo pesquisadores, as partículas de alguns dos agroquímicos são interpretadas pelo organismo como se fossem hormônios, o que desencadeia uma série de ações e reações descontroladas. Nesse processo, um comando de multiplicação de células em determinado órgão pode causar um tumor. Em fetos, essas alterações em rotas metabólicas podem comprometer o seu desenvolvimento ou o funcionamento de partes do corpo em formação. Ou até ou mesmo inviabilizar o todo, provocando abortos.

Novaes se baseia no Observatório de Saúde Ambiental, uma plataforma de dados completos sobre utilização de agrotóxicos no estado, os tipos, as regiões, as culturas onde são empregados, bem como grupos populacionais afetados por doenças reconhecidamente desencadeadas pela exposição a esses produtos. O site interativo, que permite a criação de mapas em que é possível visualizar a distribuição das informações sobre o território paulista, foi desenvolvido por professores da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.

“O mapa mostra o rastro de câncer em cidades em torno da via Anhanguera afora. Basta checar”, aponta Novaes, destacando que a Secretaria Estadual de Saúde, porém, nega todas essas evidências.

Conforme ressaltou ainda, o problema das pequenas cidades de São Paulo se repete no Mato Grosso, Goiás, Tocantins, Paraná e outros estados com grandes áreas onde o agronegócio se instalou. Por isso, conforme acredita, agrotóxicos não deve ser tema limitado aos ambientalistas, e sim de conselhos tutelares, de defesa dos direitos da pessoa com deficiência, das mulheres e de toda a sociedade. “Precisamos fazer uma análise conjuntural desse projeto assassino que está em gestão em nosso país”, alerta.

Sistema excludente

Para Marcelo Novaes, a realidade dos agrotóxicos constitui a espinha dorsal de um “sistema excludente e prospectório da vida e da natureza”. E o avanço de projetos nocivos como o PL do Veneno, o PL 3.200/15, ocorre numa perspectiva não de mudanças, mas de retrocessos. “No arcabouço jurídico, há o direito dos códigos que conversa com os poderosos e o direito da prática que oprime os oprimidos, ou seja, a população. A engenharia disso é o ilegal que para os poderoso passa a ser legal”, diz.

“É por isso que são autorizados o corte de árvores centenárias, num prejuízo ambiental irreversível, sem um plano de manejo. É por isso que a mineradora Samarco matou um rio, as praias e continua com todo o vazamento; que há falta água em São Paulo enquanto a Sabesp paga dividendos aos acionistas, que o Código Florestal tão discutido com a sociedade está sendo esculachado aqui em São Paulo, fora a privatização de áreas florestais, que permite a extração de madeira. E a população se vê diante da ameaça crescente dos agrotóxicos”, aponta.

“O ilegal passa a ser legal e há apropriação do bem público pelo privado num processo de mudança das regras do jogo em pleno jogo. É como se, num jogo de xadrez, o cavalo passasse a ser movimentado como se fosse um bispo, uma torre. A gente vai ter de encarar isso.”

Marcelo Novaes participou da audiência pública promovida dia 12, em São Paulo, pelo mandato do deputado federal Nilto Tatto (PT-SP). O parlamentar integra a comissão especial da Câmara que analisa o PL3.200/2015.

Fonte: Rede Brasil Atual

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