Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) realizou mobilizações para celebrar conquistas, entre elas, a garantia do direito à água para consumo humano para mais de 4 milhões de pessoas
A Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) – rede formada por cerca de 3 mil organizações da sociedade civil – completou, nesta quarta-feira, 26 de novembro, 15 anos de atuação em defesa do projeto político de convivência com o Semiárido brasileiro. Para celebrar a data foram realizadas ações coletivas em capitais e cidades polos de todos os estados do Nordeste e em Minas Gerais. O objetivo é dar visibilidade as conquistas, como a garantia do acesso à água para consumo humano para mais de 4 milhões de pessoas, e também dialogar com a cidade sobre o atual modelo agrícola e a qualidade dos alimentos consumidos pela população.
No decorrer desses 15 anos, o Semiárido passou por significativas mudanças, não só na paisagem, com as milhares de cisternas espalhadas nas propriedades rurais, mas na qualidade de vida do seu povo. Conhecida historicamente como uma região apenas de terra seca e rachada, a ASA passou a pautar uma nova imagem da região, mostrando que nela é possível se viver com dignidade, desde que políticas públicas adequadas fossem implementadas na região, pois a seca é uma questão climática que não se combate.
“Há 15 anos, decidimos nos organizar em uma rede, respeitando a diversidade das organizações da ASA, porque, naquela época, amadurecemos a descoberta de que não adiantava mais ficar pautando o governo isoladamente”, explica Naidison Baptista de Quintella, coordenador executivo da ASA pelo Estado da Bahia. O momento histórico a que ele se refere é a criação da ASA, em 1999, durante a 3ª Conferência das Partes da Convenção de Combate à Desertificação e à Seca (COP3), que ocorreu no Recife (Estado de Pernambuco), quando organizações e redes estaduais que já atuavam na região se organizaram e perceberam a importância de fazer uma articulação nacional.
Com a criação da ASA surgiu também o Programa Um Milhão de Cisternas (P1MC). Com ele, a rede propôs que cada família do Semiárido tivesse uma cisterna de placas para armazenar água da chuva para o consumo humano. As cisternas de placas são tecnologias simples, de baixo custo e fácil replicação e já uma tecnologia disseminada pelas organizações no Semiárido. Hoje, a ASA já implementou cerca de 800 mil cisternas, que fizeram a diferença nesta última grande seca que assolou a região, considerada a pior estiagem dos últimos 50 anos.
“Pra quem viu a realidade da seca de 1979 a 1983, viu que morreram várias pessoas, principalmente crianças, por desnutrição e, muitas vezes, com a mãe sem condições de amamentar. A água era poluída, era amarelada. Barro puro. Não tinha uma clareza de como tratar essa água. Não tinha essa discussão. Se não fosse a ASA talvez os governos não tivessem feito o que fizeram até agora, com os programas que estamos realizando”, relata o agricultor Florisval Alexandre Costa, conhecido como Flor, morador do sítio Santa Rosa, no município de Craíbas, Estado de Alagoas.
Já no ano de 2007, a ASA lançou uma nova proposta de fortalecimento do acesso à água na perspectiva da soberania e segurança alimentar das famílias. Assim, nasceu o Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2), que já implementou mais de 72 mil tecnologias distribuídas em sete tipos: cisternas-calçadão, cisternas-enxurrada, barragens subterrâneas, barriguinhas, bomba d’água populares, barreiro-trincheiras e tanques de pedra. A água armazenada nessas tecnologias serve para diversos usos, como irrigar quintais produtivos, plantar fruteiras, hortaliças e plantas medicinais, além de dar de beber aos animais.
Para Cristina Nascimento, coordenadora executiva da ASA pelo Estado do Ceará, a ASA contribui para fortalecer a importância da sociedade civil na construção e execução de políticas públicas, rompendo com o descrédito que havia por parte da população em relação as políticas. “A ASA traz o debate do Semiárido e da convivência e consegue dar expressão política a essas pautas. A nossa contribuição é extraordinária no campo da autoestima, das pessoas acreditarem que as políticas públicas podem acontecer e que as pessoas são sujeitos de direitos”.
As famílias inseridas nos programas da ASA participam de cursos, em que aprendem e trocam informações sobre técnicas de gestão da água e cuidados com as tecnologias, além de debaterem sobre o contexto político do Semiárido. Nas formações de pedreiros e pedreiras, agricultores e agricultoras, aprendem técnicas de construção das tecnologias e, com isso, podem complementar a renda. Outra importante ação são os intercâmbios de experiências nos quais agricultores e agricultoras trocam e multiplicam conhecimentos. Além disso, a ação da ASA prevê a sistematização de experiências de convivência com o Semiárido. Hoje, já são mais de 1.500 histórias de vida de famílias e grupos registradas em boletins, que tem o objetivo de resgatar, registrar e multiplicar as experiências e o conhecimento popular existente no Semiárido.
Para 2015, a ASA prevê uma nova ação, voltada para o fortalecimento das sementes crioulas, além da ampliação do projeto cisternas nas escolas, com a implementação de mais 5 mil cisternas escolares até 2016. Atualmente, já são 870 unidades de ensino da zona rural do Semiárido que contam com as cisternas escolares.
Semiárido brasileiro
Ocupa uma área de 982 mil km² e possui os biomas mais ricos do mundo: a caatinga e o cerrado. No período de seca, as plantas perdem suas folhas, mas esse aspecto é transformado com a chegada das chuvas. A média de chuvas varia de 200 mm a 800 mm anuais. É o Semiárido mais chuvoso do mundo! Sua população é composta por 22 milhões de pessoas e seu maior patrimônio são as comunidades e os povos tradicionais, sejam os vazanteiros, indígenas, quilombolas, ribeirinhos, gerazeiros e outros.
Fonte: Adital