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Diversos temas foram pautados na marcha, dentre os quais o combate à violência contra a mulher, a legalização do aborto, mais políticas governamentais que garantam direitos às mulheres

“Companheira, me ajuda que eu não posso andar só. Eu sozinha ando bem, mas com você ando melhor”. Mais de 5 mil mulheres de diversos movimentos sociais, partidos políticos e movimentos feministas se uniram para andar melhor no domingo (8), em São Paulo, em ato no Dia Internacional da Mulher.

A marcha começou na Avenida Paulista e terminou na Praça Roosevelt, região central da capital. Diversos temas foram pautados no ato, dentre os quais o combate à violência contra a mulher, a legalização do aborto, a cobrança de políticas governamentais que garantam mais direitos às mulheres e soluções para a crise hídrica no estado, que afeta fortemente o cotidiano das mulheres.

Em relação à violência, o Brasil ocupa o 7º lugar no ranking dos países que mais matam mulheres no mundo. Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública revelam que a cada 12 segundos, uma mulher é vítima de estupro no Brasil; pesquisa da Fundação Perseu Abramo aponta que, a cada dois minutos, cinco mulheres são espancadas no país.

A lei Maria da Penha, segundo dados recentes do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea), fez diminuir em cerca de 10% a taxa de homicídio contra as mulheres dentro das residências. Apesar de ser um avanço, a implantação da lei ainda é penosa.

Kátia Antunes, militante da União de Mulheres de São Paulo, organização responsável pelo curso das Promotoras Legais Populares, afirma que “é muito difícil implantar e cumprir a lei, porque o Judiciário e as delegacias de polícia emperram. A mulher tem toda dificuldade de fazer uma denúncia e, às vezes, quando faz, é ignorada por essas instâncias”.

Nalu Faria, coordenadora da Marcha Mundial das Mulheres, acredita que a lei Maria da Penha é um instrumento importante. “As mulheres estão reconhecendo onde recorrer. A lei tem o papel de não só punir os agressores, mas coibir a violência”. Para ela, no entanto, a luta contra a violência “vai muito além de assegurar o funcionamento da lei Maria da Penha. É mudar o comportamento machista da sociedade que cria essa violência”.

Outra conquista importante foi a aprovação de lei que tipifica o feminicídio (assassinato de mulheres por conta do seu gênero) como crime hediondo. A presidenta Dilma Rousseff, em pronunciamento realizado no dia 8 de março, confirmou que irá sancionar a lei. De acordo com Mariana Miranda, do Levante Popular da Juventude, tais medidas são fundamentais. “A Lei Maria da Penha foi um avanço e a tipificação do feminicídio mostra à sociedade que, quando uma mulher é assassinada, não é apenas um crime que poderia acontecer a qualquer um, e sim um crime que ocorre por ela ser mulher e por conta do machismo”.

Aborto

“Legalize! O corpo é nosso! É nossa escolha! É pela vida das mulheres!” Palavras de ordem, músicas e manifestações pela legalização do aborto ecoavam durante toda a manifestação.

Anualmente, cerca de 1 milhão de mulheres pobres realizam abortos ilegais pelo Brasil, colocando suas vidas em risco em clínicas sem estrutura ou através de métodos caseiros, sem qualquer assistência. Muitas delas morrem: o aborto clandestino é a quinta maior causa de mortes maternas no país.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que, a cada ano, são feitos 22 milhões de abortos em condições inseguras no mundo, levando cerca de 47 mil mulheres à morte, além de causar disfunções físicas e mentais em outras 5 milhões.

De acordo com Regina Jurkewicz, da organização Católicas pelo Direito de Decidir, é preciso legalizar o aborto para proteger as mulheres. “O que se quer é uma legalização do aborto, para que ele seja seguro e raro. Porque quanto mais podemos proteger as mulheres que chegam a esse ponto, com assistência e políticas sociais, menos abortos ocorrem”.

Exemplo comprovado dos efeitos da legalização é o Uruguai. O país, que legalizou o aborto em 2012, vê uma diminuição no número de mortes maternas. Segundo dados oficiais, entre dezembro de 2012 e maio de 2013, não foi registrada nenhuma morte materna por consequência de aborto e o número de interrupções de gravidez passou de 33 mil para 4 mil por ano. Junto à descriminalização, o governo implementou políticas públicas de educação sexual e reprodutiva, planejamento familiar e uso de métodos anticoncepcionais, assim como serviços de atendimento integral de saúde sexual e reprodutiva.

No entanto, essa pauta e outras que dizem respeito às mulheres são ameaçadas no Brasil por um dos Congressos mais conservadores da história. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB), já se posicionou abertamente contra a legalização do aborto.

“Esse Congresso, sobreduto o presidente da Câmara, busca trazer projetos que são contrários ao interesses das mulheres e ao interesse LGBT. O que fica para o movimento social é o ânimo para continuar lutando pelas pautas que são fundamentais para a garantia de direitos”, afirma Regina.

Faça chuva ou faça sol

A chuva apareceu por alguns momentos durante a marcha, mas desapareceu rapidamente, e não foi o bastante para impedir as mulheres de caminhar. Na luta por mais direitos e uma sociedade sem violência, a ação reuniu uma pluralidade de grupos, movimentos e pessoas, com diversas demandas feministas.

Mariana Medeiros, da União Negras Pela Igualdade, falou sobre a situação das mulheres negras na sociedade brasileira. “Estamos aqui hoje pelo combate do racismo institucional e estrutural. A mulher negra é a base da pirâmide econômica no Brasil. Tem os piores cargos, salários, acessos. Elas estão morrendo na periferia, estão testemunhando seus filhos mortos pelo genocídio da juventude negra. Nós somos a favor das afirmações das cotas e lei de políticas de ações afirmativas e da legitimidade de negros no poder”, afirma.

Já Marly dos Santos, do Movimento das Mulheres com Deficiência, apontou que as principais demandas desse grupo social são relacionadas à saúde. “Reivindicamos mesas ginecológicas adaptadas e mamógrafo móvel. Do jeito que está hoje é complicado. Na cadeira de rodas, se o mamógrafo não for móvel, não dá para fazer o exame. Em relação às mesas, o importante é poder sair da cadeira de roda com autonomia, sem precisar de enfermeiro ou médico para nos colocar na posição”.

Jobana Moya é uma imigrante boliviana de 34 anos, que chegou ao Brasil em 2008. Trabalha como autônoma, junto ao marido, em design de sites, e tem dois filhos. Segundo ela, é difícil ser imigrante no Brasil por conta da falta de direitos. “Como imigrantes, nos sentimos invisibilizadas, porque não temos documentos, não temos direito ao voto, não podemos nos organizar, não poderíamos nem estar aqui neste ato. Mas estamos aqui para deixarmos de ser invisíveis e reivindicarmos direitos”, diz.

O fato de ser mulher, segundo ela, torna as coisas mais difíceis. “O Brasil vive um momento social onde há muita imigração e a população nos enxerga como se viessemos aqui roubar alguma coisa. No último ano, a xenofobia aumentou muito. Quando saio na rua, escuto comentários, vejo a forma como olham para mim. E para muitas imigrantes não é possível nem denunciar abusos ou violências, pois elas não têm documentos”, relata.

As mulheres Sem Teto estavam lá para denunciar a crise da água em São Paulo, a falta de creches e de moradias. “Sem água, creches, escolas e postos de saúde serão fechados, empregos serão perdidos, agravando ainda mais a dura vida das mulheres. As cidades estão distantes de oferecerem condições e oportunidades iguais aos seus habitantes. As Mulheres Sem Teto, em sua maioria, estão privadas ou limitadas em seus direitos em virtude de sua situação de pobreza e violência cultural, étnica, de gênero, de idade, enfrentando dificuldades para satisfazer as necessidades básicas de suas famílias”, afirmam em nota.

Etelvina da Silva, da Frente de Luta por Moradia, tem 68 anos, é aposentada e entrou em 2014 para o movimento. Mora sozinha; tem um filho em Belo Horizonte e o outro faleceu. Além de lutar pelo direito das mulheres, quer sua moradia. “Preciso de um teto, que não tenho. Pago aluguel, e até agora não consegui uma casa. Me inscrevi na Companhia Metropolitana de Habitação (Cohab) há cinco anos, e até agora nada”.

Já para Virginia Guidson, mulher trans de 22 anos, a luta contra o preconceito é diária. Ela se reconhece desde criança como mulher, mas só a partir dos 18 anos buscou formas de tratamento para transformar seu corpo. Sua família não aceitou. “Meu pai era pastor, minha mãe não era muito religiosa, mas tive que sair de casa, como acontece com a maioria de nós. Comecei a trabalhar, viver minha vida, e hoje recuperei a relação com minha mãe”.

Segundo ela, as mulheres trans vivem uma situação de marginalização na sociedade. “Todos os dias quando você sai na rua, todos os olhares estão em você. Não temos direito ao trabalho, pois as pessoas tem muito preconceito e não contratam. Então, somos vistas como prostitutas, ou sempre tem homens querendo oferecer dinheiro para conseguir algum tipo de favor sexual. O único tipo de emprego, além da prostituição, é prestar concurso público ou recorrer a serviços terceirizados, como companhias de limpeza”.


Em relação aos tratamentos para transformar o corpo, Virginia diz que estes são insuficientes. “Só há dois hospitais em São Paulo que realizam o tratamento, o Hospital das clínicas, CPR, que é o de referência aos trans. Estou há um ano na fila de espera, porque o processo é muito burocrático: é preciso diversos laudos médicos de psiquiatras, psicólogos, clínicos gerais, para começar o tratamento, porque a transexualidade ainda é vista como uma doença pela OMS [Organização Mundial da Saúde]”.

As mulheres jovens estavam em peso no ato. Mariana Miranda, do Levante Popular da Juventude, destaca que as mulheres jovens que frequentam as universidades vêm sendo vítimas de violência e abusos. “A CPI da Violação dos Direitos mostra que nas universidades houve diversas denúncias de violação dos direitos humanos das mulheres, o que revela uma sociedade machista, patriarcal, onde as mulheres, quando sofrem violência, são culpabilizadas por aquilo, e há uma imensa impunidade”.

As demandas das mulheres são muitas, e se o 8 de março mostra alguma coisa, é que elas não vão desistir da luta, faça chuva ou faça sol.

Fonte: Brasil de Fato

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