Enquanto o presidente Jair Bolsonaro diz que seu governo vai “continuar protegendo” a Amazônia, o Pantanal e todos os outros biomas e culpa indígenas, imprensa e ONGs pelas queimadas, dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostram que o número de incêndios registrados no país este ano já é o mais alto em uma década – 12% a mais do que o registrado em todo o ano passado, que já havia tido o pior resultado.
Em discurso na reunião da Cúpula do G20, neste último domingo (22), mais uma vez o presidente defendeu o agronegócio e negou o aumento das queimadas pelo país, após dados que evidenciam o aumento do desmatamento da floresta (73.459 focos de calor só na Amazônia) e o número recorde de queimadas no Pantanal neste ano (16.667 focos).
O projeto Novos Paradigmas, uma parceria Abong, Iser Assessoria e Ibase, entrevistou a ambientalista Adriana Ramos, assessora do Instituto Socioambiental (ISA), sobre a grave situação ambiental que o país enfrenta. Confira a seguir.
Novos Paradigmas: Qual a diferença das queimadas que “sempre aconteceram”, como tenta justificar Bolsonaro, para as queimadas que estão agora acontecendo por todo o país?
Adriana Ramos: Existe uma prática comum de uso de fogo para limpeza de terrenos. Normalmente, o fogo vem após o desmatamento ou em uma área já utilizada, como é o caso em pastagens. Esse fogo pode escapar e produzir incêndios florestais. O clima é um fator que pode agravar a ocorrência de incêndios. Mas a dimensão do que vimos acontecer no ano passado e esse ano indica que o que tivemos pode ser fruto de uma ação proposital de colocar fogo de forma descontrolada. No caso dos incêndios na Amazônia, no ano passado, e do Pantanal desse ano, já há fortes indícios nesse sentido que vêm sendo investigados.
N.P.: O que está em jogo nesta política ambiental do “passar a boiada” do ministro Ricardo Salles?
A.R.: O governo está promovendo um grande desmonte das instituições e regras ambientais. O que está em jogo é flexibilizar a legislação para não impor limites ambientais às atividades privadas. Significa abrir mão do nosso marco regulatório em questões ambientais gerando riscos imensos em termos de degradação ambiental e prejuízos à qualidade de vida das pessoas.
N.P.: Há uma dimensão das consequências de toda essa tragédia ambiental?
A.R.: É imprevisível, mas considerando que estamos falando de legislações e instituições que levamos no mínimo 30 anos para construir, é possível dizer que as consequências serão drásticas e duradouras.
N.P.: Há alguma esperança para o futuro dos nossos biomas e para os povos da floresta?
A.R.: A esperança está na resistência que os povos da floresta e a sociedade civil têm imposto ao governo, por meio de mobilização do legislativo e da opinião pública, de ações judiciais e da própria força dos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais, que, mesmo sofrendo pressões e ameaças desde sempre, ainda cumprem papel super relevante na conservação de seus territórios; e na resiliência da própria floresta, que apesar de tudo, na maior parte das vezes, busca se regenerar.
(*) O Instituto Socioambiental (ISA) realiza um monitoramento diário das áreas protegidas e construiu uma plataforma que reúne as principais informações georreferenciadas da sua base de dados: o Mapa Socioambiental. Por meio do mapa, é possível consultar informações de Terras Indígenas, Unidades de Conservação e as principais ameaças que incidem sobre essas áreas, como os focos de incêndio e queimadas.
Acesse e acompanhe: mapa.eco.br/