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O escritor, poeta e ativista político e militante do movimento social quilombola e de direitos pelo uso da terra traz uma série de aprendizados e lições de sua geração

Por: Redação Diálogos do Sul

Em carta enviada pelo escritor, poeta e morador do Quilombo do Saco-Cortume, Antônio Bispo dos Santos , para ser lida durante a mesa “Revolução e Democracia Nas Cidades”, realizada virtualmente no marco do 20º Fórum Social Mundial, o escritor responde a questões estruturadas em sua trajetória e escrituradas no livro “Colonização Quilombos, Modos e Significações”.

Mais conhecido como Nêgo Bispo, o também ativista político e militante de grande expressão no movimento social quilombola e nos movimentos de luta pela terra, traz uma série de aprendizados e lições de sua geração quilombola, ou o que ele chama de “geração avó”, entre elas, o pensamento de que “nascemos no ventre da terra para aparecermos na ancestralidade!”.

A mesa é uma realização do movimento BrCidades, em parceria com a revista Diálogos do Sul e o Comitê de Luta das(dos) atingidos pelo coronavírus de Uberlândia.

Entre os presentes na mesa estavam Paulo Colosso na mediação, a arquiteta Erminia Maricato, o jornalista Paulo Cannabrava Filho, o professor Cláudio Di Mauro e outros grandes nomes no debate.

Confira à integra do documento:

Quilombo Saco Curtume, 07 de outubro de 2020,

Querida geração neta afrodescendente e ou afrodiaspóricas, onde quer que estejam e como preferirem ser chamadas,

                                                                                   Axé 

   Ao tempo em que eu Antônio Bispo dos Santos, Velho Bispo, Nego Bispo, ou seja, lá como queiram chamar, como parte da geração avó quilombola… ouso escrever estas mal ortografadas linhas… com assuntos que me interessam muito, porém não sei se vão interessar às pessoas para quais estou destinando, é porque estou me dispondo a receber as respostas tais quais se tornarem consequentes.

Nesse momento estou bastante festivo e espero que estas escritas possam lhes encontrar em situações de muitas festividades, assim iniciaremos nossas confluências… nesse sentido peço licença para compartilhar algumas inspirações que recebi da minha geração avó e depois lhes fazer algumas perguntas a respeito.

       Então… vejamos o que as mestras e os mestres de minha geração avó, mais presente em minha vida, me falaram, não nessa ordem, mas… em contextos diversos o que da mesma forma pretendo dizer a vocês.

     … Eu não tive filhas nem filhos, porém ajudei a criar muita gente… não tive riquezas, mas comi e dei de comer… estou chorando, porque lhe ensinei tudo que sabia, mas não sabia tudo que queria lhe ensinar… as vezes precisamos nos unir às pessoas ruins, porque as boas já tem donos… a vasilha de dar é a mesma de receber… tudo que se mede é pouco… não espere ajuda de quem você ajudou, não confunda ajuda com troca… ao desatolar uma res tenha cuidado, ela pode arremeter contra você… plante o que precisar e a terra lhe dará o que você merecer…

a terra dar e a terra quer… o melhor lugar para se guardar os peixes é no rio… o melhor lugar para se guardar as batatas é na terra… o melhor lugar para se guardar os frutos é nas árvores… não é feio pedir, pedir é ruim, feio é deixar pedir… tudo vai acabar como começou… devemos transformar as armas dos inimigos em nossas defesas e etcetera.

 O que eu compreendi a partir de tudo isso?… Que a vida é começo meio e começo ou seja… geração vó começo, geração mãe meio e geração neta começo de novo… assim como a semente é o começo, a árvore é o meio e a semente o começo novamente…  que o mundo é redondo para que as pessoas não se enganchem nos cantos… quem nunca passou por uma encruzilhada não sabe escolher caminhos… cupim que vai pra festa de tamanduá, dificilmente volta… nossas trajetórias sustentam nossos discursos

É a partir daí que algumas questões me aparecem com respostas muito explicativas e pouco resolutivas, tais como… porque entre as vidas animais que eu conheço, só a humanidade produz armas de destruição em massa!?  Será por se auto intitular como a única existência inteligente!?… Como fica a situação de um povo que põe a geração neta na creche e a geração avó no asilo e diz que a família é a base de tudo!?… E mais… um povo que põe veneno na terra, põe esgoto nas águas e resíduos gasosos no ar o que devem esperar da natureza!?

Todos os exercícios que eu fiz, na tentativa de responder a essas questões, estão estruturadas em minha trajetória e escrituradas no livro colonização quilombos, modos e significações… que está disponível na internet em PDF… 

Serei muito grato pelas respostas que vocês da minha geração venham me oferecer através de qualquer forma de linguagem…

Já me darei por satisfeito só pelo fato de haver um diálogo intergeracional.

Com os sentimentos de quem está se preparando para um novo começo, eu faço uma pausa dizendo que…

Nós nascemos nos ventres das mães mulheres para aparecermos na terra…

E nascemos no ventre da terra para aparecermos na ancestralidade!

                       Vivas, porque todas as vidas importam!

                                                               Nego Bispo.

Guilherme Fagundes Nêgo Bispo é Poeta, escritor, professor, ativista político e militante do movimento social quilombola e de direitos pelo uso da terra.

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