Para promotor, corte de ponto atenta contra o direito de greve, que é assegurado na Constituição e já foi reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal
São Paulo – O promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social Ministério Público Estadual Otávio Ferreira Garcia manifestou-se contrário ao corte de salário dos professores que aderiram à greve iniciada no dia 16 de março, em decisão encaminhada ao Tribunal de Justiça de São Paulo na tarde de hoje (6). O desconto nos salários começou a ser praticado nesta semana. Segundo o promotor é “ilegal qualquer ameaça ou o efetivo corte do ponto e/ou o desconto dos dias parados dos professores grevistas, ao menos enquanto o movimento não for declarado ilegal pelo Poder Judiciário”.
A manifestação se dá em resposta a ação civil pública impetrada pelo Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), que pediu a manutenção dos pagamentos dos docentes. O sindicato argumentou que os grevistas passaram a sofrer ameaças de que seriam anotadas as faltas injustificadas, de desconto dos dias parados, e até de demissão ou rescisão dos contratos de trabalho, por parte dos diretores das escolas.
A RBA conversou com professores que tiveram o desconto realizado, como o professor de Língua Portuguesa Paulo Araújo, que teve pouco mais de um terço do salário referente a março descontado e não recebeu o vale-transporte. “Fiquei 40 dias em greve, mas não podia me arriscar mais financeiramente. Eu moro sozinho, mas pago aluguel. Isso faz com que eu tenha que fazer empréstimos e usar cartão de crédito para me manter. E como é minha única fonte de renda eu tive que sair da greve”, explicou ele, que teme sofrer ainda mais descontos referentes aos dias de paralisação em abril.
O promotor ressaltou que o direito de greve é assegurado na Constituição Federal e já foi reconhecido pela Suprema Corte como passível de ser exercido, inclusive por funcionários públicos, portanto, não é admissível o desconto no salário. “A remuneração é o sustento dos professores. Sem ela, os provimentos básicos de uma vida digna estarão ameaçados”, argumentou.
Cortar o ponto dos professores seria o mesmo que ameaçar ou efetivamente descontar da remuneração os dias parados da gestante ou do servidor no gozo de licença-saúde, defendeu Garcia. “Não haverá como reparar os danos que eventual desconto dos dias parados causará de imediato nas vidas desses profissionais.”
A presidenta do sindicato, Maria Izabel Azevedo Noronha, a Bebel, considerou a prática uma tentativa de intimidar os grevistas. “A medida de corte foi claramente coibitiva. É uma piada: o professor luta por melhorias no salário e fica sem ele. Todas as categorias têm direito a greve e a possibilidade de repor os dias parados. E a gente sempre repõe”, afirmou.
Amanhã (7), o Tribunal de Justiça vai intermediar uma reunião de conciliação entre os professores e o governo paulista. O vice-presidente da corte, Eros Piceli, mediará o encontro, às 15h. Bebel considerou “positiva” a manifestação do MP. Ela espera que a Justiça reconheça o direito dos professores. “Se eu não tivesse esperança não teria entrado com o pedido de dissídio. Estamos tentando negociar, mas o governo se nega”, defendeu Bebel. A audiência será a portas fechadas, conforme informou a assessoria do tribunal.
Os professores vão aguardar o resultado da conciliação na Praça da Sé, centro da capital paulista, onde, às 13h30, farão um ato de desagravo aos professores do Paraná, que foram duramente reprimidos pela Polícia Militar paranaense no último dia 29, durante manifestação contra o Projeto de Lei 252, de 2015, que alterou o sistema previdenciário do estado.
Os professores estão em greve desde 13 de março e reivindicam reajuste de salário de 75,33% para garantir a equiparação salarial com outras categorias profissionais que possuem o mesmo nível de formação e denunciam as más condições de trabalho, como a precarização dos professores temporários, que não têm seus direitos trabalhistas reconhecidos, e o fechamento de 3 mil salas de aulas e a consequente superlotação.
O governo paulista, após três reuniões dos grevistas com o secretário da Educação, Herman Jacobus Cornelis Voorwald, não apresentou nenhuma contraproposta aos docentes. O que indica que o reajuste salarial seria zero. Na próxima semana, a Apeoesp vai fazer uma denúncia da situação da educação no estado de São Paulo para a ONU nos mesmos moldes da efetuada ontem pela subsede Taboão da Serra do sindicato.
A Apeoesp também pretende denunciar as péssimas condições de trabalho da categoria para a Organização Internacional do Trabalho (OIT). Um exemplo é a situação dos professores temporários – categoria O –, que não têm direitos trabalhistas garantidos, nem 13º salário ou férias. Também não têm atendimento do Hospital do Servidor Público Estadual e têm de ficar 40 dias sem trabalhar ao final do primeiro ano de contrato e 200 dias no segundo ano.
A próxima assembleia de professores será sexta-feira (8), às 14h, no vão livre do Masp, na avenida Paulista.
Fonte: Rede Brasil Atual, por Rodrigo Gomes