Na manifestação, na greve, no rolezinho, para conter uma pessoa com problemas mentais ou até para intervir em um conflito entre adolescentes em uma escola, o resultado é sempre violência policial, por vezes com mortes. Veja lista que escancara o despreparo da PM, da Polícia Civil e da Secretaria de Segurança Pública paulista
Por Igor Carvalho e Ivan Longo, da Revista Fórum
Na última quinta-feira (25), Benedito Barbosa, conhecido como Dito, foi preso em uma ação violenta da Polícia Militar do Estado de São Paulo. Ele foi jogado ao chão e, com truculência, imobilizado pela “Tropa de braço”. Chegou a urinar na calça enquanto era arrastado até a viatura. Seu crime: Como advogado, que milita há anos na área de direitos humanos, tentou entrar em um prédio para acompanhar uma reintegração de posse na região central da capital paulista.
No mesmo dia, Everton Rodrigues, que é um dos fundadores do coletivo “Por que o senhor atirou em mim?”, que questiona a violência policial, foi preso após fotografar uma viatura da PM que estava estacionada em local proibido.
Ainda na semana passada, provando que o desequilíbrio para lidar com a população é hierárquico e não morre nos muros dos batalhões, o secretário de Segurança Pública de São Paulo, Fernando Grella, afirmou que integrantes do Movimento Passe Livre (MPL) serão levados à força para sobre Inquérito 01/2013, considerado ilegal por juristas. Isso porque, após cinco intimações os ativistas se recusam a comparecer na sede do Departamento Estadual de Inquérito Criminal (Deic).
Com o fim do semestre, o SPressoSP selecionou 20 episódios que demonstram o desequilíbrio e despreparo da Polícia Militar de São Paulo, Polícia Civil e da Secretaria de Segurança Pública. Na manifestação, na greve, no rolezinho, para conter uma pessoa com problemas mentais ou até para intervir em um conflito entre adolescentes em uma escola, o resultado é sempre violência policial, por vezes com mortes.
Confira a lista.
Rolezinhos: 11 de janeiro
Policiais militares expulsaram jovens que realizavam um “rolezinho” no shopping Itaquera, na zona leste da capital.Agentes da Ronda Ostensiva com Apoio de Motocicletas (Rocam) usavam cassetetes para bater nos adolescentes. Outros policiais desferiram socos contra os participantes do evento. À época, os jovens afirmavam que queriam “invadir nada, apenas nos divertir.”
Cracolândia: 23 de janeiro
Operação do Departamento Estadual de Prevenção e Repressão ao Narcotráfico (Denarc), da Polícia Civil, na área da Cracolândia, região central de São Paulo, reprimiu dependentes químicos do local com bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha.
Fotógrafo apanha da Tropa de Choque: 23 de janeiro
Após um protesto dispersado pela Polícia Militar, em São Paulo, manifestantes e jornalistas correram para um hotel na rua Augusta, onde se abrigaram. Porém, agentes da Tropa de Choque invadiram o local e um fotógrafo da agência EFE foi agredido. Um vídeo flagrou a violência contra o profissional da imprensa.
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Fabrício Proteus Chaves: 25 de janeiro
O estoquista participava de uma manifestação quando foi abordado por dois agentes da PM. A primeira versão da Secretaria de Segurança Pública dizia que Fabrício Proteus Chaves atacou os policiais com um agente. Um vídeo divulgado alguns dias depois desmentiu a versão do Estado e mostrou que o jovem não reagiu.
Esquizofrênico baleado: 01 de fevereiro
Um homem, que sofre de esquizofrenia, foi baleado durante uma abordagem da polícia militar, no bairro de Rechã, em Itapetininga. Thiago Guimarães Proença, de 31 anos, teve uma crise nervosa e saiu para a rua, após discutir com os pais. Assustados, vizinhos acionaram a Polícia Militar. Quando chegaram, os policiais foram alvo de Proença, que os teria atacado com uma bengala. Os PM’s revidaram disparando 6 tiros contra Proença.
Adolescentes na escola são agredidos: 14 de fevereiro
O caso aconteceu na escola estadual Capitão Virgílio Garcia, na cidade de São Simão, a 50 quilômetros de Ribeirão Preto. A polícia teria agredido um aluno, o que gerou a revolta dos demais e resultou em uma ação ainda mais truculenta da PM no dia seguinte. Revoltados, os estudantes quebraram os vidros da escola e atearam fogo nas cortinas. Quando a PM voltou ao local, um grupo com cerca de 30 alunos estava aglomerado na entrada da escola. A violência começou quando um policial agarrou um menino de 12 anos pelo braço e lançou spray de pimenta na direção dos alunos. Sob a vaia dos jovens, a polícia deixou o local e algumas pedras voltaram a ser arremessadas contra a vidraça.
262 presos: 24 de fevereiro
O 2º Ato contra Copa do Mundo, em São Paulo, foi interrompido bruscamente pela Polícia Militar. Antes disso, 40 manifestantes haviam sido intimados para depor no mesmo horário da manifestação. Dos mil manifestantes que compareceram, 257 foram presos, outros cinco jornalistas acabaram detidos. À época, Marcos da Costa, presidente da OAB-SP, disse que a polícia não tem o direito de prender manifestantes e levá-los para prestar depoimentos se nesse momento não estavam cometendo um crime. “O papel da polícia é proteger a manifestação, atuar no caso de serem cometidos crimes que ameacem o direito do manifestante. Neste caso, até os profissionais da imprensa tiveram seu direito de exercer a profissão violado.”
A polícia confisca o salário do manifestante: 24 de fevereiro
O digitador Vinícius Souza Ruiz, de 25 anos, teve parte de seu salário confiscada pela polícia durante o 2º Ato contra a Copa, realizado neste sábado (22), no centro da capital paulista. Vinícius foi um dos 262 manifestantes detidos pela Polícia durante o ato. Ele disse que os policiais suspeitaram que os R$ 984 que trazia consigo seriam para pagar participantes do protesto. “Trabalho como digitador e ganho R$ 1.055. Estava com R$ 984 para meu uso pessoal, o dinheiro não é sujo.”
Invasão no Moinho: 25 de fevereiro
Pouco tempo após as 16h, três policiais do Departamento Estadual de Prevenção e Repressão ao Narcotráfico (Denarc), em um carro preto, teriam invadido a favela do Moinho disparando tiros para o alto, segundo os moradores, que reagiram e apedrejaram o carro. Os agentes, então, foram obrigados a sair. Pouco tempo depois, os mesmos policiais retornam ao local com reforço e novamente invadiram a comunidade. Dessa vez, um homem – ainda não identificado – foi preso. As moradias da comunidade foram revistadas e, segundo os moradores, “muitas pessoas foram esculachadas”. Na saída, mais tiros. Moradores relataram que os agentes da Civil teriam ido ao local para retirar o “arrego”, uma espécie de propina, mas que se frustraram com o não pagamento.
PM mata 10 e comandante dispara: “Quem não reagiu, está vivo”: 19 de março
Após uma ação da Polícia Militar que resultou na morte de dez pessoas, o comandante da operação, coronel Cássio Roberto Armani, afirmou que “aqueles que se entregaram estão vivos.” A operação durou quatro dias e, além das dez mortes, a PM prendeu outras cinco pessoas. Os quinze são suspeitos de integrarem um grupo que invadiu um shopping center e explodia caixas eletrônicos litoral paulista. Para o comandante Armani, a operação foi correta. “A Polícia Militar prima pela legalidade acima de tudo”.
Negros: O alvo preferido da PM: 28 de março
Uma pesquisa realizada pelo Grupo de Estudos sobre Violência e Administração de Conflitos da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) revelou dados inéditos a respeito da desigualdade racial na taxa de letalidade da Polícia Militar do Estado de São Paulo. Os resultados são preocupantes: no ano de 2011, por exemplo, a PM matou quase três vezes mais negros do que brancos.
José. Negro e jovem. Preso sem culpa: 29 de abril
A Polícia Militar invadiu o apartamento da família de José [nome fictício] e o prendeu, acusado de assalto a mão armada. O jovem foi inocentado após os jornalistas André Caramante e Bruno Paes Manso divulgarem vídeos que revelam a farsa da prisão forjada.
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Ato de 20 minutos e tiro, porrada e bomba: 15 de maio
A manifestação contra o Mundial da Fifa, que integrava o “Dia internacional de luta contra a Copa”, em São Paulo, durou apenas 20 minutos. Quando os manifestantes desciam a rua da Consolação foram alvo da violência policial. No cruzamento da rua Matias Aires com a rua da Consolação, exatamente no momento em que os manifestantes começaram a gritar: “Não acabou, tem que acabar, eu quero o fim da Polícia Militar”, ouviram-se as primeiras bombas e tiros.
Bala de borracha no olho: 15 de maio
No mesmo ato reprimido com 20 minutos, Patricia Rodsenko foi atingida no olho por uma bala de borracha atirada por policiais. A quantidade de sangue na calçada explica o tamanho do ferimento. Patrícia nem participava da manifestação, apenas voltava para casa após ir ao cinema com uma amiga.
O protesto contra a chacina policial acaba…com violência policial: 30 de maio
Moradores do Jardim Paraná, na Brasilândia, zona norte da capital paulista, saíram às ruas, na noite da última quinta-feira (29), para protestar pela morte de três adolescentes em abril deste ano. A manifestação terminou com intervenção da Polícia Militar, que atirou bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha contra os manifestantes. Moradores tentaram o diálogo, mas não houve espaço, como mostra o vídeo.
1968? Estudante é torturado pela polícia: 09 de junho
Preso após manifestação em apoio aos metroviários, que estavam em greve, o estudante Murilo Magalhães foi espancado e torturado por agentes da PM às portas fechadas, de acordo com a Assembleia Nacional dos Estudantes Livre (Anel), movimento social em qual milita.
Polícia ataca grevistas dentro do Metrô: 06 de junho
Por volta das 6h30 da manhã desta sexta-feira (6), trabalhadores do Metrô foram atacados pela Tropa de Choque da PM, depois de se reunirem em resistência à abertura da estação Ana Rosa, da Linha 1 – Azul. Eles tentavam convencer os “fura greve” (funcionários do campo administrativo, que não têm experiência na condução dos trens) a não iniciar as atividades nesta manhã quando foram surpreendidos pela chegada da polícia que, sem diálogos, os expulsou da estação à tiros de bala de borracha e bombas de efeito moral.
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Fábio Hideki. Mais uma prisão forjada?: 24 de junho
O estudante Fábio Hideki e o professor Rafael Marques Lusvarghi, que estão sendo investigados pelo Deic sob a acusação de portar explosivos durante manifestação contra a Copa do Mundo, seguem presos; um policial chegou a atirar com arma de fogo para dispersar o ato. A prisão foi efetuada por policiais civis à paisana e um vídeo mostra que não foram encontrados os explosivos na mochila de Hideki.
Preso e agredido por ser advogado: 25 de junho
Benedito Barbosa, advogado da Frente de Luta por Moradia – movimento que liderava a ocupação – foi brutalmente imobilizado e agredido por agentes da tropa de choque. O local foi completamente cercado pela polícia e, ao tentar entrar no edifício para conversar com os moradores, foi impedido pelos policiais, que agiram da maneira como mostra o vídeo abaixo:
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O inquérito político da Secretaria de Segurança Pública: 26 de junho
Integrantes de movimentos estão sendo intimados a comparecer ao Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) para prestar depoimento. O motivo é o inquérito 01/2013, que de tamanho grau de exceção é o primeiro e único com esse caráter, como indica o número. Criticado por juristas, o “Inquérito Black Bloc”, como ficou conhecido dentro da Secretaria de Segurança Pública (SSP), afiançadora da investigação, é uma tentativa de punir, em especial, integrantes do Movimento Passe Livre (MPL) por uma conduta coletiva, ao invés de apurar os delitos individuais entendidos como “vandalismo” praticados nas manifestações.