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Medidas adotadas no governo interino cortam recursos da saúde e colocam em xeque um direito universal das pessoas

Por Marcela Reis, do Observatório

A Câmara dos Deputados aprovou em primeiro turno substitutivo apresentado por Romero Jucá (PMDB-RR), à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 143/2015, que permite que municípios, estados e o Distrito Federal apliquem em outras despesas uma parcela de até 25% dos recursos ligados às áreas específicas, como a saúde. A votação foi em abril e a PEC ainda deverá ser votada em segundo turno, mas já representa um risco para a saúde pública com o possível corte de orçamento, medida que será estendida até 2023.

Essa é a principal, mas não a única ameaça de retrocesso no sistema público de saúde presente nas medidas anunciadas até aqui pelo governo interino de Michel Temer (PMDB). O pacote de maldades contra este direito constitucional é amplo: investimentos públicos não terão aumento real de um ano para o outro, acompanhando somente a inflação do ano anterior; o Fundo Social do Pré-Sal, que funciona como uma poupança destinada à saúde e educação, não existirá mais; e o programa Mais Médicos será revisto, buscando diminuir o número de profissionais estrangeiros/as – hoje 73% do total de médicos/as.

O ataque contra a saúde pública é explicito. Em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, o atual ministro da Saúde, Ricardo Barros (PP-PR), declarou que o país pode vir a não sustentar mais o acesso universal à saúde. “Vamos ter que repactuar, como aconteceu na Grécia, onde cortaram as aposentadorias”, afirmou.

Nathália Meiva, médica e membro da Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares, aponta que a diminuição do financiamento para a área de saúde vai ser uma situação de catástrofe e vai prejudicar a sociedade como um todo. “O SUS (Sistema Único de Saúde) diminuído vai fazer as pessoas perderem atendimento, não terem medicamentos e os funcionários não serem pagos. Do que jeito que está a construção de política social do governo [Temer], o SUS pode acabar”, alerta.

Em entrevista à Rede Brasil Atual, o ex-ministro e atual secretário de Saúde de São Paulo, Alexandre Padilha, também afirma que o SUS pode acabar com o governo interino. “Em primeiro lugar, eu acho que devemos sim repensar o tamanho do SUS. Para maior. Mais dinheiro, mais médicos, mais leitos, mais acesso. O SUS é um projeto ousado e que sempre dependeu muito da luta dos movimentos sociais. E a única chance de o SUS não acabar, com as medidas anunciadas pelo governo golpista, é essa intensidade de luta continuar”.

Criado em 1990, o SUS foi uma conquista dos/as brasileiros/as, que reivindicaram um sistema de saúde para todos/as, e serve de modelo para muitos países. É um dos maiores sistemas públicos de saúde do mundo. Só em 2014 foram 4,1 bilhões de procedimentos ambulatoriais, 1,4 bilhão de consultas médicas e 11,5 milhões de internações.

Programa Mais Médicos

Outra medida do Ministério da Saúde é diminuir a participação de estrangeiros/as no Programa Mais Médicos, logo depois das eleições municipais. O governo vai renegociar para 2017 o contrato com a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), responsável pelo alistamento de médicos/as. Hoje, 73% dos/as profissionais são estrangeiros/as, a maior parte deles/as cubanos/as.

Os/as médicos estrangeiros/as se concentram nas Unidades Básicas de Sáude (UBS), responsáveis pela Estratégia da Atenção Primária à Saúde, focada na prevenção e recuperação do/a paciente. Nathália explica que nessas unidades há um olhar mais ampliado e cuidadoso do que nos hospitais.

Nathália afirma que, sem os/as médicos/as estrangeiros/as, se não forem contratadas pessoas para estarem nessas unidades, um dos pilares do sistema de saúde é quebrado. “Se as unidades não crescem e têm menos investimento, impossibilita a criação de novas, e a perspectiva é que afunde junto com o SUS. É uma perda porque o crescimento da Atenção Primária foi um dos nossos maiores ganhos dos últimos anos”.

Cerca de 71% da população brasileira já foi a estabelecimentos públicos de saúde para ter atendimento. Do total, 47% disseram que as UBS foram o primeiro contato com os serviços do SUS. Ao todo são 40.674 unidades em todo país.

Visão de Estado e resistência

As mudanças propostas para a área da saúde se articulam com outras propostas de Temer, como a saída da Petrobras da exploração do pré-sal, cortes na educação e outras. Juntas, elas deixam clara a busca do chamado Estado mínimo, defendido pela ideologia neoliberal.

“Em tempos de retrocessos de direitos, especialmente os direitos sociais, é importante reafirmar a convicção por um modelo de Estado em que este não exerce apenas o papel de regulador da economia, mas sim o principal sujeito de garantia dos mais variados direitos, entre eles a saúde”, afirmou Jorge Gimenez, educador popular do Centro de Educação e Assessoramento Popular (Ceap), em artigo publicado pela Abong.

Para Nathália, essa luta passa pela organização e mobilização da sociedade civil, com a defesa do SUS nos conselhos de saúde, manifestações e cobrança do poder público. “Todos são válidos, mas a grande aposta são as manifestações, é o povo na rua. Precisa da mobilização social que pauta necessidade de um sistema de saúde. Não tem outra via mais efetiva”, completa.

Foto: Reprodução da internet

 

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