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Brasil, 26 de julho de 2021

Sua Excelência 

Michelle Bachelet  

Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos 

Senhora Alta Comissária, 

As entidades que assinam esta carta veem com extrema preocupação a declaração ameaçadora do Ministro da  Defesa do Brasil ao processo eleitoral de 2022. Segundo noticiado hoje pelo jornal O Estado de São Paulo, no  dia 22 de julho de 2021, o Ministro da Defesa, Walter Braga Netto, no dia 8 de julho último, acompanhado dos  chefes da Marinha, Exército e Aeronáutica, pediu para comunicar que, “a quem interessar, diga que, se não tiver  eleição auditável, não terá eleição’.1 Segundo apurou o periódico, em conversa com um grupo restrito da política  e do Poder Judiciário, a declaração foi dada em tom sério, o que criou um clima tenso entre os interlocutores,  um deles dizendo : “[a] conversa que eu soube é que o ministro da Defesa disse a um dirigente de partido. Teve  um momento de muita tensão. Não foi brincadeira, não.”2 

O Brasil implementou há décadas um sistema seguro de votação por urna eletrônica, o qual tem sido  regularmente testado por instituições independentes e experts em segurança cibernética. Ademais, o sistema é  auditável e as apurações são vistoriadas pela sociedade civil, inclusive por membros dos próprios partidos. O  processo eleitoral brasileiro é acompanhado de perto por várias entidades internacionais que não detectaram  problemas com as eleições pós ditadura, tampouco no sistema das urnas eletrônicas. As eleições no Brasil estão  a cargo do Poder Judiciário, tendo sido criada uma justiça eleitoral especializada e com presença em todos os  Estados da Federação. A Justiça Eleitoral vem cumprindo seu papel institucional, de acordo com a Constituição.  Desde que tomou posse, o Presidente Jair Bolsonaro tem atacado sistematicamente o atual sistema eletrônico,  sem, contudo, apresentar provas minimamente plausíveis. Em seu ataque sistemático, o Presidente com  frequência ameaça o Tribunal Superior Eleitoral e o processo eleitoral do Brasil. Em uma de suas ameaças,  durante uma transmissão através de mídia social, dia 6 de maio, enfatizou: 

“Ninguém aceita mais esse voto que está aí. A única republiqueta do mundo que aceita o voto  é a nossa, que aceita esse voto eletrônico. Isso tem que ser mudado. Se o Parlamento, sendo  3/5 da Câmara e do Senado, aprovar e promulgar, vai ter voto impresso em 2022 e ponto final.  Não vou nem falar mais nada. Vai ter voto impresso. Se não tiver voto impresso, não tem  eleição. Acho que o recado está dado”.3 

Em suastrês décadas de redemocratização, o Brasil ainda vem tendo sérios desafios, com um processo de justiça  de transição gradual e tardio, uma dívida histórica enorme com a população negra, quilombola, cigana, indígena,  LGBTI, de mulheres, pobre e de periferia, que necessita das instituições democráticas para exercerem seus  direitos em condições de igualdade. A ameaça vinda das Forças Armadas tem uma conotação grave no contexto  brasileiro, em vista da ditadura militar que perdurou do Brasil de 1964 a 1985, dando um verdadeiro tom de  ameaça à democracia participativa e social no Brasil. 

1 https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,ministro-da-defesa-faz-ameaca-e-condiciona-eleicoes-de-2022-ao-voto impresso,70003785916 

2Ibid. 

3 https://www.otempo.com.br/politica/vai-ter-voto-impresso-em-2022-e-ponto-final-dispara-bolsonaro-em-live 1.2481971

O atual governo, atuando na contramão das conquistas duramente alcançadas, ameaça a democracia no Brasil,  fecha o espaço cívico, nega a existência da ditadura militar, além de deixar de garantir direitos básicos aos grupos  marginalizados no País. Ademais, o alto grau de participação das Forças Armadas no atual governo, sem que o  País tenha passado por um processo completo de justiça de transição, é um tema de preocupação. 

Pedimos à Alta Comissária a mais alta atenção sobre o conteúdo desta carta. 

Em resistência:

1. Articulação Pacari Raizeiras do Cerrado
2. Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil
3. Assessoria Popular Maria Felipa – MG
4. Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos
5. Associação Brasileira de Organizações Não-governamentais – ABONG
6. Associação Juízes Para à Democracia – AJD
7. Centro de Estudos sobre Justiça de Transição da UFMG
8. Comissão justiça e paz sao Paulo 
9. Comissão Pastoral da Terra
10. Conselho Indigenista Missionário – CIMI
11. Fundação Luterana de Diaconia – Centro de Apoio ao Pequeno Agricultor – Conselho de Missão entre  Povos Indígenas (FLD-COMIN-CAPA)
12. Iepé – Instituto de Pesquisa e Formação Indígena
13. Instituto Cigano do Brasil – ICB 
14. Instituto Vladimir Herzog
15. Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social
16. Movimento Nacional de Direitos Humanos- MNDH Brasil 
17. Novo Projeto Social – Transbordamos Amor
18. OMCT – World Organization Against Torture
19. RCA – Rede de Cooperação Amazônica
20. Red Internacional de Derechos Humanos – RIDH
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