ONGs apresentam argumentos contrários à equiparação do tráfico privilegiado a crime hediondo e Fachin decide rever seu voto
Os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) retomaram na última quarta-feira (1/6) o julgamento do Habeas Corpus 118533, apresentado pela Defensoria Pública da União, que pode equiparar o chamado tráfico privilegiado, em que o réu é primário, tem bons antecedentes e não integra organização criminosa, aos crimes hediondos. Na prática, uma decisão nesse sentido dificultaria a progressão de pena de pessoas condenadas por pequeno tráfico, mantendo-as por mais tempo no sistema prisional.
O julgamento foi interrompido depois de um pedido de vista de Edson Fachin, que já havia se pronunciado pela equiparação. Ele decidiu revisar seu voto em face das informações apresentadas através de memorias pela Conectas, pelo IBCCrim (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais) e pelo IDDD (Instituto de Defesa do Direito de Defesa). No documento, as entidades evidenciam o impacto que a equiparação teria na superlotação dos presídios e no encarceramento feminino.
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Segundo dados de dezembro de 2014 do Ministério da Justiça, 28% da população carcerária responde por crimes relacionados ao tráfico de drogas. Apenas entre as mulheres, a taxa sobe para 64%. Segundo Rafael Custódio, coordenador de Justiça da Conectas, esse inchaço acontece porque a lei atual é usada para enquadrar usuários como traficantes e em detrimento de penas alternativas. Os alvos prioritários, afirma, são homens e mulheres jovens, negros e pobres das periferias.
Custódio explica ainda que uma decisão da Corte favorável à equiparação agravaria esse cenário de exclusão e vulnerabilidade. “Além do efeito explosivo na superlotação, porque deixaria as pessoas por mais tempo nos regimes fechado e semiaberto, a equiparação contraria a lógica da própria Lei de Drogas, já que a norma reconhece que nesses casos específicos a resposta do Estado deve ser menos gravosa”, afirma Custódio.
Para ele, é temerário que a Corte vá na contramão do debate internacional, onde ganha força a defesa de soluções alternativas à prisão para lidar com o tema. “Lembremos que esse é o mesmo tribunal que está julgando a descriminalização do porte para uso pessoal”, completa, referindo-se à análise do recurso extraordinário 635.659, iniciada em agosto de 2015 e interrompida depois de pedido de vistas feito pelo ministro Teori Zavascki. “Seria um retrocesso histórico perpetrado pelo Supremo”, afirma.
Além de Fachin, quatro ministros afirmaram que o tráfico privilegiado é crime hediondo. Três votaram contra esse entendimento. Não há previsão para a retomada do julgamento.
Fonte: Conectas