O encontro contou com a participação da maioria das organizações que integram o Fórum Ecumênico ACT Brasil: Coordenadoria Ecumênica de Serviço (CESE), Fundação Luterana de Diaconia (FLD), Rede Ecumênica da Juventude (REJU), KOINONIA Presença Ecumênica e Serviço, Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (CONIC), Conselho Latino-Americano de Igrejas (CLAI), Conselho Mundial de Igrejas (CMI), ACT Alliance, Chrisitan AID, Processo de Articulação e Diálogo (PAD), Aliança de Batistas do Brasil, Centro de Estudos Bíblicos (CEBI), Programa de Formação e Educação Comunitária (PROFEC), Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular (CESEEP), Comissão de Ecumenismo e Diálogo Inter-religioso da CNBB, Igreja Metodista, Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, Igreja Presbiteriana Unida do Brasil, Visão Mundial, Associação dos Seminários Teológicos Evangélicos (ASTE). Para o painel de abertura, outras organizações também estavam representadas, como a comunidade Bahá’í do Brasil, o Centro Cultural Brasil Turquia (CCBT), o Templo Budista Terra Pura de Brasília, a organização Conectas, a agência HEKS, o Centro Cultural de Brasília, além da anfitriã, Cáritas.
A reunião anual do Fórum Ecumênico ACT Brasil, inciou na segunda-feira, dia 15 de agosto, com a apresentação dos trabalhos de formação realizados pelo Serviço Anglicano de Diaconia e Desenvolvimento (SADD), junto às suas comunidades sobre o tema gênero, sexualidades e direito. O trabalho apresentado por Sandra Andrade, coordenadora do SADD.
Na manhã do dia 16 de agosto, foi realizado o painel Religião e Democracia – Dilemas atuais sobre fé e poder. O painel fez parte do lançamento, junto às organizações do Fórum Ecumênico ACT Brasil, da Campanha Mais Direitos Mais Democracia – maisdireitosmaisdemocracia.org.br.
O tema do painel foi abordado por Zwinglio Mota Dias, reverendo emérito da Igreja Presbiteriana Unida do Brasil e professor da Universidade Federal de Juiz de Fora, Ronilso Pacheco, teólogo e agente social do Viva Rio e Luana Basílio da Plataforma Dhesca.
Professor Zwinglio dedicou sua apresentação em memória à pastora da IECLB Rosa Marga Rothe, ativista pelos direitos humanos, que faleceu este ano. Em relação aos dilemas entre fé e poder, Zwinglio iniciou destacando que:
1) Nossa civilização montou um desafio mentiroso e, assim como vamos, não é possível satisfazer esse sentido de esbanjamento que se deu à vida. Isso se massifica como uma cultura de nossa época, sempre dirigida pela acumulação e pelo mercado. Prometemos uma vida de esbanjamento, e, no fundo, constitui uma conta regressiva contra a natureza, contra a humanidade no futuro. Civilização contra a simplicidade, contra a sobriedade, contra todos os ciclos naturais .Ou pior: civilização contra a liberdade que supõe ter tempo para viver as relações humanas, as únicas que transcendem: o amor, a amizade, aventura, solidariedade, família.” (José ‘Pepe’ Mujica)
2) “O que vemos hoje não são guerras de religião ou de civilização. Estamos diante de algo da ordem do assassinato e estes assassinatos têm relação estreita com as paixões niilistas de uma era que esqueceu justamente os grandes valores do humanismo, valores estes que não são específicos do Ocidente, mas sim compartilhados por muitas culturas e civilizações.” (Roland Gori)
3) Ecumenismo… “é mediar trabalho em unidade e na promoção de diálogos entre as religiões. Em um esforço conjunto para além da tolerância, sem proselitismos, mas na proposta de fraternidade, que una forças para denunciar as desigualdades sociais, a discriminação, a exclusão, o sexismo, o machismo, a homofobia ou quaisquer outros tipos de violências que possam impedir o abraço, o afeto, a ternura em favor da humanidade.” (Valeria Cristina Vilhena)
Em relação ao momento atual, Zwinglio destacou que mais do que em outros períodos, nunca foi tão grande a busca pelo sentido da vida. A situação atual é dominada por uma racionalidade que não consegue satisfazer as carências humanas. Somos desenraizados e sós! Zwinglio recupera Rolin Gore que afirma que “Fomos tão longe no desencantamento do mundo e na dessacralização do universo, que enfrentamos a nudez de uma razão puramente instrumental. O terrorismo também é parte dessa racionalidade. Pertence à mesma civilização. Essa perda de sentido, de existência do mundo alimenta a guerra de todos contra todos e promove o surgimento de uma revolução conversadora.
Perdemos a razão de ter esperança… Temos de dar um basta ao neoliberalismo, que aumenta as desigualdades sociais.O terrorismo também é parte dessa racionalidade. Pertence à mesma civilização, Essa perda de sentido, de existência do mundo alimenta a guerra de todos contra todos e promove o surgimento de uma revolução conversadora.
Perdemos a razão de ter esperança… Temos de dar um basta ao neoliberalismo, que aumenta as desigualdades sociais.
Em relação ao atual momento político brasileiro, Zwinglio afirmou que o golpe político, midiático religioso, com apoio de um grupo dito evangélico, faz parte de nova forma de intervenção do neoliberalismo. O Brasil volta a ser submetido aos interesses do capital do internacional. “Saem do armário” os grupos de direita, retorna a velha ideia de impérios dominantes (EUA e Estados europeus).
Por fim, ofereceu pistas para um novo olhar para a presença religiosa na sociedade destacando que:
“Nossas teologias e percepções religiosas sufocam e impedem as manifestações mais sublimes de fé. O conceito bíblico de fé não tem a ver com “acreditar em”, mas significa confiança e esperança. É preciso esquecer os nomes de Deus e as religiões inventadas para encontrar Deus na vida. Há que se recuperar a graça e a beleza da vida, para além dos compêndios dogmáticos, e nos abrir para leituras mais metafóricas de nossa experiência.
– Busca pela justiça é o desafio primeiro em todas as nossas ações.
– Buscar o diálogo com todas as outras manifestações religiosas = hospitalidade: oferecer ao hóspede o quarto mais arejado e luminoso (Martha Luchese).
– Acolher o/a diferente com admiração e respeito, pois nele/a se reflete o inefável da vida.
– Assumir os mitos fundamentes de nossas culturas.
– Cuidar da terra como lar comum de toda a humanidade.
– Sermos compassivos/as e amorosos/as e cheios/as de misericórdia no trato das questões que nos dividem.
Em seguida, a representante da Plataforma DHESCA apresentou parte dos resultados do relatório sobre o Estado Laico realizado pela Plataforma. Luana iniciou explicando porque é que sentiu-se a necessidade de realizar uma relatoria específica sobre o estado laico no Brasil. Lembrou que por ocasião do relatório sobre Saúde e da Educação foi identificado que havia interferência de religiões nas políticas públicas na área da saúde. Muitos profissionais de saúde negavam-se a realizar determinados procedimentos na saúde com o argumento de objeção de consciência. Se o procedimento necessário não estivesse de acordo com os valores religiosos do profissional de saúde ele simplesmente negava-se a realizar. Em 2015 o Rio aprovou a chamada “Lei de objeção de consciência”: permite aos servidores a negar atendimento por liberdade de crença Aprovada em maio de 2015. Luana citou alguns casos concretos de desrespeito à laicidade do Estado:
1) Uma transexual que no posto de saúde não era chamada pelo nome social e durante o exame foi obrigada a escutar músicas gospel.
2) Um filho de santo vestido com sua roupa religiosa e com guias, embora estivesse sangrando não foi atendido, o profissional de saúde negou-se a tocar no paciente.
3) Prática da benção dos fuzis – para que os traficantes expulsem as mães de santo das comunidades.
4) Pessoas muçulmanas entregaram um dossiê com 300 denúncias de violação de direitos.
5) Uma criança de cinco anos da rede pública – cujos pais são ateus – expressaram sua insatisfação com o fato da criança ser obrigada a fazer oração ou cantar músicas religiosas todos os dias na escola. Quando a escola foi notificada de que não poderiam obrigar a participação da criança neste momento devocional, a criança precisou ser escoltada. Esta criança passou a ser perseguida e precisou trocar de escola.
6) Em Brasília, a parlamentar Sandra Paraji, vem perseguindo professores/as que tratam do assunto LGBT, por exemplo. Nesta mesma cidade, sem anuência dos pais, alunos eram levados para manifestação em prol do projeto “Escola sem partido”.
Luana destacou que a ruptura do estado laico é expressão do racismo e machismo.
Casos (Rio de janeiro):
Lembra que nas câmaras municipais e no congresso nacional, as pautas relacionadas a gênero e racismo têm sido atropeladas. Destacou que há uma profunda violência institucionalizada que está sendo legalmente constituída.
Ronilso Pacheco lembrou que nossa trajetória histórica é violenta. Basta lembrar os períodos de escravidão e de ditadura civil-militar. Enquanto a escravidão é pensada como um grande bloco (mesmo envolvendo a tortura diária de cada homem e mulher negra), a ditadura nos remete a violências mais pessoais. O racismo é um dos legados da violência histórica. A ditadura está presente nas práticas do aparato policial de hoje.
A resposta de Jesus – perdoar 70 X 7 vezes lembra Lamec, que seria vingado 70 vezes. Uma proposta de vingança é contraposta por Jesus com o perdão como forma de quebrar do ciclo de violência.
O perdão, no entanto, está esvaziado de sentido. O perdão precisa ser entendido como capacidade de: a) não repetição da violência; b) reconhecimento da violência; c) enfrentamento da violência.
Ronilso apresentou três desafios:
1. Como é possível esvaziar do poder essa dimensão da fé exclusivista? É possível movimento ecumênico inter-religioso “iconoclasta” que sacralizasse a justiça dignidade e cidadania, toda vez que o poder for o grande ídolo?
2. Como quebrar a força da violência impregnada no poder, frear a atmosfera da violência.
3. Como superar o discurso da tolerância para uma construção comum e igual. Superar a ideia da tolerância como objetivo.
O fruto da justiça será a paz, a obra da justiça consiste na tranquilidade (Jr). A justiça é o amor tornado política pública!
Outro momento de grande importância na reunião do FEACT – Brasil foi a participação do representante para América Latina e Caribe de Act Aliiance, senhor Carlos Rauda. Carlos apresentou a política de emergência e incidência de ACT Alliance e seus desafios para a região. A afirmação da democracia e a luta contra o extermínio de populações indígenas permeou a conversa com Carlos Rauda.
No último dia de reunião, dia 17 de agosto, foram estabelecidos critérios para novas organizações integrarem o Fórum. A Visão Mundial foi acolhida formalmente para integrar o Fórum. Além disto, foram escolhidas as linhas prioritárias de ação de FEACT para o período de agosto de 2016 a agosto de 2017, sendo:
1- Fortalecer a Identidade Ecumênica
– (Re) Encantamento com a causa ecumênica (para dentro e para fora das igrejas);
– Agenda Comum.
2- Incidência por direitos e democracia
– Migração;
– Diversidade religiosa;
– Povos tradicionais;
– Gênero;
– Juventudes com prioridade para REJU.
3- Comunicação
– Formação interna;
– Democratização dos meios de comunicação;
– Criação da Rede de Comunicadores/as das Organizações do FEACT;
– Aproveitar a realização do encontro do CESEEP para animar novas redes de comunicação;
– Fortalecer a Plataforma de Ação e Diálogo como canal de comunicação com as Agências Financiadoras.
Na opinião da secretária-geral do CONIC, Romi Bencke, esse encontro foi importante pela presença expressiva das Igrejas. “Participaram oficialmente da reunião as igrejas Metodista, Episcopal Anglicana do Brasil, Presbiteriana Unida do Brasil, Católica Romana, Aliança de Batistas. Outro destaque foram as presenças de ACT Alliance, da Plataforma de Ação e Diálogo e da Christian Aid. Muito positiva foi a acolhida da Visão Mundial para fazer parte do Fórum e a possibilidade de acolhermos novas organizações”, afirmou.