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‘Onde as instituições são precárias, quando não existentes, e o Estado é omisso, o racismo encontra espaço para exercer sua crueldade’, afirma Udinaldo Júnior, relator nacional de Direitos Humanos

Por Edna Nunes, da Cardume(*)

Não é à toa que organizações da sociedade civil e movimentos sociais continuam, paulatinamente, denunciando o genocídio negro em todo o país. Dados do Atlas da Violência, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgado em junho deste ano aponta que em 2017, 65.602 pessoas foram assassinadas no Brasil, superior aos 62,517 registrados no ano de 2016. O documento revela ainda que a proporção de negros entre o total de homicídios saltou de 71,5% para 75,5% e que as regiões Norte e Nordeste concentram os piores índices, a do Piauí. Por esse motivo, ao longo de todo este mês de novembro, o Centro de Estudo e Defesa do Negro no Pará (Cedenpa) tem intensificado suas ações nas escolas públicas para apontar às crianças e jovens de baixo poder aquisitivo possibilidades de bem viver na perspectiva de afastá-los da violência, sejam como autores, sejam como vítimas.

A militante do movimento negro Fátima Matos informa que uma série de atividades estarão nas ruas de Belém e em outros municípios paraenses para retratar o racismo existente no país, apesar da Constituição Federal (CF) dizer que “todos são iguais perante a lei” e existir uma legislação que criminaliza o racismo. “Por isso que o Dia Nacional da Consciência Negra – 20 de novembro, é fundamental a nós e a toda sociedade brasileira, não apenas ao negro, com o objetivo de garantir o que está prevista na CF, igualdade a todos. Mas, para isso, temos que reduzir a distância das informações dos trabalho que a população negra enfrenta ao bater em determinadas portas, porque ela não sabe quem vai abrir”, enfatiza.

Segundo ela, o ponto alto da agenda do Dia da Consciência Negra em Belém será no dia 24 deste mês, na praça da República – antigo cemitério dos escravos -, onde ocorrerá uma kizomba (festa) e denúncias das violações dos direitos que disparam contra a população do povo negro, sobretudo, da região amazônica. Fátima conta que o genocídio negro é pauta essencial na manifestação, porque é também no dia 1º de novembro que se marca o Dia de Combate ao Genocídio Negro.

“Infelizmente os dados oficiais são subnotificados, porque nem toda execução que o jovem negro é vítima se notifica. O que o movimento negro pontuará com ênfase ao longo desses dias de ativismo é sobre as mortes de jovens negras da periferia em conflito com as leis e economia ilícita, que são as drogas, motivadores de execuções sumárias, genocídio negro, ou seja, a necropolítica, quer dizer, a política da morte existente no país que mantém uma polícia que se preocupa em matar e conta com um presidente que autoriza isso”, lamenta.

Relatório

A matança sumária do povo negro não se concentra apenas nas ruas das capitais brasileiras. Os Relatores Nacionais de Direitos Humanos da Plataforma Descha Brasil estiveram em Altamira (PA) para realizar a Missão Emergencial sobre o Genocídio Negro e Racismo nas Unidades Prisionais e Reassentamentos Urbanos Coletivos (RUC’s). De 17 a 19 de outubro passado, a relatoria apurou uma série de violações de direitos humanos por conta da instalação da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, que provocou dinâmicas urbanas e criminais no município e nos RUC’s, onde há precariedade de vida das famílias desalojadas com o surgimento da hidrelétrica.

“Onde as instituições são precárias, quando não existentes, e o Estado é omisso, o racismo encontra espaço para exercer sua crueldade. O percurso da construção de Belo Monte até o Massacre de 29 de julho legou uma história de horror para a cidade de Altamira”, afirmou Udinaldo Júnior, relator nacional de Direitos Humanos. Por sua vez, o relator Luiz Fábio Paiva, comentou que “a missão da Plataforma Dhesca Brasil, em Altamira, revelou as consequências de um empreendimento destrutivo para a economia, para o meio ambiente e para os modos de vida das populações da Amazônia. Belo Monte é o retrato do racismo ambiental operado para negar e, literalmente, matar pessoas negras, indígenas, caboclas, ribeirinhas e integradas ao ecossistema amazônico”, pontuou.

O relatório completo da visita dos relatores nacionais será divulgado pela Plataforma Descha nos próximos meses, motivado pelas violações de direitos registrados no presídio de Altamira e que veio à tona em julho, deste ano, quando ocorreu a execução de quase 60 presos e denúncias de torturas sofridas pelos detentos.

Insegurança

Apesar de o Governo do Estado do Pará afirmar redução da violência em todo o território paraense, incluindo os homicídios, há quem garanta que a sensação é de total insegurança. “Perdi meu filho na prisão de Altamira, onde cumpria pena de dez anos por tráfico. Eu morava lá, mas agora moro em Belém, porque os traficantes queriam cobrar da gente o que ele devia. Se souberem da gente, eles vêm atrás. Agora a gente fica assim, escondido”, lamenta a mãe do rapaz de 23 anos, dependente químico e traficante. Ela conta que desde os 13 anos o filho teve contato com as drogas, mas só foi perceber que ele era um “viciado” aos 15 anos.

A mulher relata a sua história com o filho envolvida por um sentimento de culpa, mas garante que “fiz o que pude por ele e não fiz mais porque tinha que trabalhar para dar o sustento deles”. Vivendo escondida, atualmente não trabalha e faz acompanhamento psicológico para superar a síndrome do pânico surgida com a morte do seu caçula, que era negro e não concluiu o ensino fundamental. “Se pudesse teria feito mais por ele, uma criança que quando não tava drogado era a pessoa mais amorosa que conheci”, lamenta.

(Foto: Reprodução | atividade da Unipop)

*Com informações do site da Plataforma Descha

(*)CARDUME – Comunicação em Defesa de Direitos é uma rede que reúne organizações e movimentos da sociedade civil para ações articuladas de comunicação que potencializem a promoção e defesa de direitos e bens comuns.

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