SP recebe o 1º Congresso Igrejas e Comunidade LGBTIQ+ com o tema ‘Diálogos Ecumênicos Para o Respeito à Diversidade’
Por Franklin Félix
O Brasil vem atravessando, nos últimos anos, um processo de profunda transformação política e social. Além disso, temos constatado o retrocesso dos direitos LGBTIQ+ na maioria da região latino-americana, o aumento do fundamentalismo religioso e de reacionarismos em espaços da sociedade brasileira, como com as campanhas “contra a ideologia de gênero” e da “Escola sem Partido”, o aumento das desigualdades e violências que gera o aumento das vulnerabilidades da população LGBTIQ+, expresso, por exemplo, no aumento de transmissão do vírus HIV entre os mais jovens, especialmente gays, homens que fazem sexo com outros homens e pessoas trans. Esse contexto tem nos levado a refletir sobre a importância de uma articulação ampla de religiosos e religiosas LGBTIQs.
Diante disso, as comunidades baseadas na fé têm apresentado diferentes posições nas questões envolvendo suas espiritualidades e a diversidade sexual e de gênero. Ora apoiando e acolhendo, ora excluindo ou invisibilizando seus fiéis e suas lideranças, tornando, ou não, seus espaços religiosos seguros.
Os desafios do acolhimento das pessoas da comunidade LGBTIQ+ geram diferentes respostas nas comunidades religiosas, tais como: a) o abandono integral de fiéis dos espaços religiosos para minimizar conflitos com suas lideranças e/ou irmãos da fé; a busca de outros espaços, cristãos ou não, para vivenciar/experienciar o culto, a fé e espiritualidade; o surgimento de posições de resistência nos seus espaços religiosos, visando torná-los acolhedores e seguros. Em contrapartida, para as igrejas e lideranças religiosas, essas diferentes respostas por parte de seus fiéis e de suas estruturas implicam em uma série de desafios ainda pouco refletidos.
Desde a última quinta-feira 13 de junho, a LGBTfobia se tornou crime no Brasil. A decisão foi do Supremo Tribunal Federal, que declarou a omissão do congresso em legislar em defesa da comunidade LGBTIQ+ e determinou que o crime de racismo seja enquadrado nos casos de agressões contra lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e travestis, até que a norma seja aprovada pelo Parlamento.
Com essa importante conquista para a comunidade LGBTIQ+, religiosas e religiosos, acadêmicos e acadêmicas, especialistas, defensores e defensoras dos direitos humanos e ativistas se reunirão em São Paulo para analisar a conjuntura dos direitos humanos de LGBTIQ+, debater acesso ao sagrado, a promoção de exemplos de ações inspiradoras no campo religioso e LGBTIQ+, a criação de redes de articulação de iniciativas existentes e o fortalecimento de atores para incidência pública na defesa dos direitos em um contexto de enfrentamentos e busca de proteção.
O encontro que acontecerá de 19 a 23 de junho de 2019, com o tema “Diálogos Ecumênicos Para o Respeito à Diversidade”, está sendo organizado pela Paróquia da Santíssima Trindade e pela organização da sociedade civil Koinonia Presença Ecumênica e Serviço, em parceria com IAET (Instituto Anglicano de Estudos Teológicos São Paulo), Diocese Anglicana de São Paulo, Igreja da Comunidade Metropolitana (ICM), Rede Nacional de Grupos Católicos LGBTIQ+, Christian Aid Brasil e Prefeitura de São Paulo.
Nos últimos 50 anos, em âmbito internacional, sobretudo após a Revolta de Stonewall, se visibilizaram demandas e constituíram-se respostas institucionais e jurídicas às necessidades de LGBTIQ+.
No Brasil, esse processo se inicia ainda nos anos 1970, mas ganha maior fôlego a partir da redemocratização em meados da década de 1980 e toma maior intensidade nos anos 2000. A partir de então ocorreram muitos avanços, em especial no campo das políticas públicas, da ação do judiciário e de associações/conselhos científicos, destacando-se, em 2004, o Programa “Brasil Sem Homofobia”, do governo federal, e em 2008 a 1ª Conferência Nacional LGBT. Contudo, muitas lacunas surgiram, tais como programas governamentais sem dotação orçamentária ou o cancelamento de projetos como o “Escola Sem Homofobia” – que havia sido construído com participação do movimento social organizado, universidades e Ministério da Educação – por pressões das alas conservadoras da sociedade.
Todo esse caminhar se fez refletir nos diversos espaços religiosos, principalmente em espaços cristãos, gerando reações proativas para inclusão de pessoas fiéis LGBTIQ+ em algumas comunidades religiosas, com o surgimento das chamadas Igrejas Inclusivas e de movimentos inclusivos, aprovação de leis canônicas em Igrejas Tradicionais, ordenação de lideranças religiosas, extensão do matrimônio, e até mesmo questões envolvendo batismo e retificação de nome para pessoas trans.
Nestas últimas décadas observamos a pluralização da presença da fé no espaço público e político no Brasil. Esse avanço tem trazido desafios na direção do respeito ao compromisso com o Estado Laico. Tais desafios se intensificam a partir dos anos 2010 em âmbito internacional, com inflexões específicas na América Latina e Caribe, com o crescimento dos fundamentalismos e das intolerâncias, inclusive de base religiosa, e a ascensão de governos conservadores nos costumes e ultraliberais no âmbito da economia, aprofundando as desigualdades e vulnerabilidades.
Assim, optamos pela construção de um Congresso que utiliza a experiência do ecumenismo como chave de análise e construção de reflexões coletivas. A longa trajetória de encontros nos quais fiéis e pessoas clérigas de diversas denominações e tradições podem sentar-se ao redor da mesa para partilhar suas perspectivas e experiências se demonstrou uma importante ferramenta para o avanço do debate em pautas muitas vezes consideradas tabus no ambiente religioso.
Uma perspectiva ampla de ecumenismo nos permite estender essa mesa para todas as pessoas de boa vontade, sejam elas de fé ou não, mas que compartilhem de um compromisso com a justiça e a inclusão de todas as pessoas.
1º CONGRESSO IGREJAS E COMUNIDADE LGBTIQ+
“Diálogos Ecumênicos Para o Respeito à Diversidade”
Paróquia da Santíssima Trindade (Diocese Anglicana de São Paulo), São Paulo, SP
De 19 a 23 de junho de 2019
(Foto: Divulgação)