BRASÍLIA – Mesmo com o apelo e as críticas dos presidentes da Câmara e do Senado e o bombardeio da oposição, o governo não vai rever o decreto da presidente Dilma Rousseff que institui a Política Nacional de Participação Social e regulamenta a atuação dos conselhos populares, garante o ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho. “E o Congresso vai ter que explicar para a sociedade por que derrotou uma proposta em que nada ofende”. Segundo Carvalho, o governo ficou muito assustado com a reação ao decreto, que, diz ele, não determina a criação de conselhos, mas estimula setores que não têm esta prática a adotá-la.
Há ao menos 40 conselhos e comissões dentro do governo. Não são suficientes? Qual a necessidade do decreto?
Ficamos muito assustados com a reação que houve. O decreto não determina criação de conselhos; o que faz é estimular que setores que não têm essa prática a adotarem-na. O decreto é para dar uma organizada geral nos conselhos e estimular novas formas de participação, como as mídias sociais. Temos consciência de que não se deve criar conselhos por decreto. Os que existem, quase todos foram criados por lei, ou seja, passaram pelo Congresso Nacional. É uma loucura esses caras dizerem que haverá um conselho, por exemplo, no Ministério da Defesa, que vai quebrar sigilos. O que o decreto faz é reconhecer a realidade. Se o Congresso tiver interesse em discutir conselhos, maravilha. Há muitos defeitos na representação.
Os conselhos hoje são apenas consultivos. O decreto dá mais poderes a eles?
Essa é uma bronca dos conselhos. Eles querem ter poder de decisão dentro do governo. Esse é um debate que nunca arriscamos. O governo resiste. Transitar do poder consultivo para o deliberativo é complicado. Aí, sim, haveria muita chiadeira. Mudaria o caráter do conselho, e isso precisaria passar pelo parlamento.
Outro temor é que decisões do governo tenham que ser submetidas a eles.
Não existe isso no texto. Os conselhos, que existem desde a década de 30, apenas contribuem com o Executivo, não decidem. Só o Conama (Meio Ambiente) e o Conanda (Criança e Adolescente) têm poder executivo. Lançamos o decreto num momento de confraternização com a sociedade civil. E, nesse clima eleitoral, alguns articulistas e órgãos de imprensa fizeram uma leitura enviesada e convenceram parlamentares de sua inconstitucionalidade.
Os conselhos hoje só atuam na área de políticas sociais. Por que não, por exemplo, na economia?
Na atual correlação de forças e na formação do governo, vejo com muita dificuldade que se consiga criar uma participação social no Conselho Monetário Nacional (CMN) ou em outro conselho da área financeira. Até na área de infraestrutura é difícil. Tanto que o decreto não fala de conselhos nessa área. A novidade é que teremos um fórum de representação da sociedade no Itamaraty. Serão duas reuniões anuais para avaliação da nossa política externa. Insistimos que esses conselhos só beneficiam a sociedade, porque cobram do governo transparência. Dá trabalho essa coisa de ter que sentar, discutir, ouvir. Mas é necessário.
É zero a chance de a presidente rever o texto?
É zero! É zero! A gente prefere ser derrotado. E aí o Congresso vai ter que explicar para a sociedade porque derrotou uma proposta em que nada ofende. Não queremos briga. Se o Congresso aceitar, gostaríamos de fazer audiência pública para discutir a natureza e o amadurecimento da participação da sociedade. Não só por conta das manifestações. É didático. Um governo democrático tem que estar aberto para esse debate, se não vai gerando processos muito mais complexos, como os black blocs e outras formas que criam enormes problemas para a sociedade. A relação com os conselhos é imperfeita. Eles dão muito pau no governo. Há ministérios, e ministros, mais sensíveis a essa participação, mas há outros que não gostam, porque dá trabalho. É um espaço que não é de lazer nem de cooptação. Tem representatividade até de outros partidos. Não é coisa do PT.
O público das manifestações de junho é bem diferente do que frequenta conferências e conselhos, não?
Sim, daí a nossa inquietude de abrir para a participação das redes sociais nessas esferas. Em São Paulo, começou com o movimento da juventude ligada à questão da passagem de ônibus. Depois foi crescendo, houve repressão. Mas houve adesão de muitos setores, até conservadores. O lamentável é uma minoria que argumenta que a atuação da polícia na periferia justifica a violência nesses atos. Dizem que não agem contra as pessoas, mas contra os bancos. Mas também acabam destruindo lixeiras e placas de trânsito. Para eles, o PSTU e o PSOL representam a direita e nós, o governo, somos bandidos. Por isso os atos perderam fôlego.