Por Eduardo Amorim de Centro Sabiá.
Mais de 1.600 delegados e 400 convidados, representando 29 países, participaram da 5ª Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Se o encontro não terminou com o esperado lançamento do Programa Nacional para Redução do Uso de Agrotóxicos, certamente deixou claro para quem acompanhou mesmo que de longe os debates que a temática estará no centro de diversos embates que estão e continuarão sendo travados no Congresso Nacional e na vida pública brasileira.
Presidenta do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, Maria Emília Pacheco, em sua fala na presença da presidenta Dilma Roussef deixou claro o posicionamento da grande maioria dos que lutam pela segurança alimentar: “Todos irmanados estamos com muita expectativa e pela urgência que tenhamos um programa nacional de redução do uso de agrotóxicos, para que a gente realize esse lema da comida de verdade”, afirmou, citando o mote da Conferência. Apesar disso, o Governo Federal não fez o lançamento, mas a luta segue e a pressão passa a ser para que o lançamento, adiado pela não assinatura por parte do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, se dê com o apoio dos outros nove ministérios envolvidos no tema durante a Conferência Nacional de Saúde.
O combate aos agrotóxicos é considerado um elemento forte na luta por segurança alimentar e nutricional. A presidenta do Consea citou além do Pronara vários outras questões que estão relacionadas a esse tema, como o projeto desenvolvimentista de uma nova fronteira do agronegócio, nos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia: “Matopiba está na contramão do nosso lema”, garantiu. Ela lembrou também que será preciso empenho para barrar o projeto que visa eliminar a necessidade de rotulagem dos produtos transgênicos no Congresso Nacional, para garantir que os consumidores possam fazer a escolha sabendo o que estão verdadeiramente comprando.
Coordenador do Centro Sabiá, Alexandre Pires participou da Conferência como membro da coordenação da Articulação no Semiárido Brasileiro (ASA) pelo estado de Pernambuco. Apesar da decepção com o não lançamento do Pronara, ele fez uma avaliação de vários pontos positivos no encontro. “Todo mundo muito unido em torno da agroecologia”, a participação das comunidades tradicionais e a maioria de mulheres no público (54%), além da assinatura pelo Governo Federal de nova lei que controla propaganda de alimentos voltados à crianças de 0 a 3 anos e o lançamento pelos ministérios do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e do Desenvolvimento Agrário do Programa Nacional de Sementes e Mudas para a Agricultura Familiar.
Uma certeza, no entanto, é que o debate não se encerra com o fim da 5ª Conferência. No tema das sementes, que vem sendo muito trabalhado pela Articulação no Semiárido através do projeto de Sementes Crioulas (Programa Sementes do Semiárido), por exemplo, três empresas (Monsanto, Dupont e Syngenta) controlam 65% das sementes comerciais no mundo e existe um risco grande de se eliminar o direito histórico dos agricultores de armazenarem e replantarem suas sementes com a liberação pelo Congresso Nacional das sementes conhecidas como “Terminator”.
Ouça o discurso na íntegra da presidenta do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional, Maria Emília Pacheco, aqui. Ou leia mais alguns dos principais trechos da presidenta do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional.
Para a presidenta Dilma Roussef: “Valorizamos o compromisso do seu governo em garantir a Continuidade de programas sociais sem cortes como o Bolsa-família; programas de convivência com o semiárido P1MC, Um milhão de cisternas e Uma Terra e Duas Águas. Temos um cenário de maior reconhecimento sobre a atuação das mulheres na promoção da segurança alimentar e nutricional. Maior visibilidade sobre as condições nutricionais das populações negra, povos indígenas, quilombolas, povos tradicionais de matriz africana e demais povos e comunidades tradicionais. Mas ainda permanecem os piores índices de insegurança alimentar e nutricional para esses segmentos sociais que estão a requerer a continuidade e a ampliação das políticas de superação das desigualdades de gênero, raça e etnia para a garantia da segurança alimentar e nutricional”
Sobre o o risco de perdermos a memória alimentar do país: “Queremos fazer um chamamento, uma convocação à sociedade e aos governantes, sobre as potencialidades e as ameaças ao nosso sistema alimentar. Defendemos a comida como um patrimônio e não como mercadoria. É urgente valorizar as diferentes tradições culturais culinárias e ter em conta o valor cultural da comida. Assegurar o direito humano à alimentação significa garantir também o direito ao gosto contra a padronização dos hábitos alimentares. Reconhecer os diferentes significados dos alimentos como expressão dos modos de vida, do sagrado, dos laços de reciprocidade, dos sistemas alimentares com a nossa rica biodiversidade. Por isso falamos da função social da terra e dos sujeitos de direitos”.