Entidade avalia que redução de pressão tem levado a desabastecimento injusto e cobra plano de contingência efetivo para a região metropolitana de São Paulo
São Paulo – A Aliança pela Água, rede com 48 organizações que realiza ações sobre a seca em São Paulo, pretende monitorar o racionamento informal que vem sendo praticado pela Sabesp a partir das manobras de redução de pressão. Para isso, a entidade lançou ontem (18) um mapa colaborativo, no qual a população pode denunciar o horário e o tempo em que sofreu o desabastecimento. “A medida tem ocorrido de forma muito desigual, afetando sobretudo as regiões mais pobres. Mesmo os horários que a Sabesp informou anteriormente não têm sido respeitados”, afirmou Marússia Whately, coordenadora da Aliança.
As denúncias realizadas no site Sala de Crise vão compor um relatório semanal, a partir do qual a Aliança vai questionar a Sabesp e o governo de Geraldo Alckmin (PSDB) sobre a falta de água e cobrar medidas para equalizar a situação. Em breve, a Aliança pretende lançar um aplicativo para celular com o mesmo objetivo. “Nos próximos seis meses, a perspectiva é de que a falta de água só deve se agravar. Essa ação visa a contrapor a narrativa de que está tudo bem”, disse Marússia.
A redução de pressão é a principal ação da Sabesp para reduzir o gasto de água. Oficialmente, consiste na utilização de redutores nos encanamentos e em diminuir o bombeamento, de forma que não se perca muita água nos vazamentos – que consomem até 30% de toda a água tratada pela estatal. No entanto, muitos bairros chegam a ficar dias inteiros desabastecidos e não somente com a pressão diminuída. A companhia já anunciou que está intensificando a medida.
A ativista demonstrou descrença em relação ao plano de contingência que Alckmin prometeu apresentar até o fim deste mês. Segundo Marússia, a minuta apresentada às entidades na segunda reunião do Comitê de Crise não é clara quanto às ações que serão realizadas de acordo com a evolução da crise. São dois documentos: um da Defesa Civil, que trata até mesmo da ocupação das dependências da Sabesp pelo Exército brasileiro, e outro da Secretaria Estadual de Saneamento e Recursos Hídricos, que trata das questões técnicas e cenários de crise.
“O plano não apresenta gatilhos. O que será feito em relação ao nível de água que os reservatórios forem atingindo? São três cenários demonstrados, mas não diz o que acontece se o Sistema Cantareira chegar a 10% do volume total, por exemplo. Ou como vão ser atendidas as escolas, os hospitais”, explicou Marússia.
Hoje, o Cantareira está com 19,9% da capacidade, considerando duas cotas do volume morto. No dia 19 de junho do ano passado, o sistema tinha 22,6% da capacidade, com uso de apenas uma cota do volume morto. No início deste período seco, o conjunto das represas estavam com nível 30% abaixo do que continham em 2014.
Marússia avalia que o segundo semestre deste ano será muito complicado. Não só pela queda no volume dos reservatórios com o período de seca – entre maio e outubro –, mas também pela determinação da Agência Nacional de Águas (ANA) e do Departamento de Água e Energia Elétrica (DAEE) de redução da retirada de água para um máximo de 9 metros cúbicos por segundo (m³/s) no Cantareira a partir de agosto. Antes da crise, o volume de retirada era de 33m³/s, para atender a 8,8 milhões de pessoas.
“Todo o indicativo é de chuvas abaixo da média. E a maior parte das obras não vai ficar pronta agora. Também não sabemos qual será o impacto de usar dois anos seguidos a água do volume morto. A realidade é que não temos clareza do que vai acontecer. Por isso, a Aliança cobra maior transparência e um planejamento para a crise em conjunto com a sociedade e as organizações. Não vai ser um único ator que vai resolver”, defendeu Marússia.
Para atender à população afetada pela redução no Cantareira, a Sabesp está realizando a transposição entre os sistemas Rio Grande (represa Billings) e Taiaçupeba, no Sistema Alto Tietê. A obra vai transferir 4 m³/s de água entre os reservatórios. Assim, a companhia pretende retirar mais água do Alto Tietê – que também sofre muito com a seca – levando água retirada da represa Billings, que já tem transferido água para suprir também o aumento da demanda da represa Guarapiranga.
“Só fazer obra não vai resolver. Está trocando uma água por outra de reservatórios em crise. Até agora não vimos nenhum movimento que signifique uma mudança na forma de gerir a água. A estiagem foi o estopim da crise. O fundo das represas aparecendo expôs uma crise de gestão”, afirmou Marússia.
Fonte: Rede Brasil Atual, por Rodrigo Gomes