Marcha de abertura do Fórum Social Mundial reuniu milhares em Salvador. Mais de 25 mil pessoas de 120 nacionalidades discutem outras formas de desenvolvimento e bem viver até dia 17
“Estamos aqui para sonhar e fazer juntos um outro mundo”. Assim Ingrid Santos, 24, estudante de Aracajú (SE), explica a presença de milhares de pessoas na marcha de abertura do Fórum Social Mundial na tarde desta terça-feira (13), em Salvador. Militantes de 120 países se inscreveram para o evento. Cerca 25 mil pessoas realizaram inscrições prévias, mas o número deve aumentar com a chegada das caravanas estrangeiras, conforme dados divulgados nesta manhã durante coletiva de imprensa. O Fórum segue até dia 17.
A marcha percorreu as ruas entre o Campo Grande e a Praça Castro Alves, tradicional circuito carnavalesco da capital baiana. Mas, dessa vez, os protagonistas do grande evento não estavam em cima de trios elétricos, como acontece tradicionalmente em fevereiro. Nem por isso faltou batucada. As juventudes, mulheres e trabalhadores trouxeram latas e tambores para amplificar seus suas palavras de ordem e reivindicações. As estampas da abadas deram lugar a uma variedade enorme de cores e dizerem de camisetas de centenas de organizações politicas da mais variadas pautas.
Com o tema Resistir é Criar, Resistir é Transformar, o Fórum terá mais de 1.600 atividades autogestionadas pelas entidades que participam do evento,totalmente horizontal, a maioria delas no Campus Ondina da Universidade Federal da Bahia. A programação completa pode ser consultada no site do evento em diversos idiomas (clique aqui para ir).
Além de fazer as tradicionais críticas ao capitalismo, boa parte das atividades apresentará formas inovadoras de desenvolvimento. “Entendemos que a resistência também é construir o novo”, afirmou Mauri Cruz, membro do Conselho Internacional do Fórum, durante a coletiva, antes do início da marcha. “As saídas nós temos. Faltam políticas públicas para ampliá-las”, enfatizou, referindo-se ao modelo de desenvolvimento capitalista.
Conjuntura atual x contexto histórico
A presidenta da União Nacional dos Estudantes (UNE), Mariana Dias, enfatizou a importância de equilibrar o enfrentamento da conjuntura política atual do país, após um golpe que destituiu a presidenta Dilma Rousseff, com problemas estruturais. “É preciso falar de questões históricas de opressão. E o Fórum se propõe a isso”, reflete.
No mesmo sentido, Milena Nascimento, do Instituto Àwúre, afirmou a importância das mulheres negras no Fórum e a denúncia ao genocídio da juventude negra e a perseguição aos povos tradicionais quilombolas e de terreiro. “Para fazer valer a discussão”, afirmou.
A força dos movimentos em torno de questões que atravessam décadas deu a tônica da marcha, com presença marcante da população negra de vários países e estados e mulheres. “É sempre o nosso coro que é tirado primeiro.Dizer isso aqui em Salvador, onde tanta coisa aconteceu, é ainda mais especial. Minha mão tem muito calo de segurar bandeira em ato. Eu não me canso. Eu escolhi fazer essa luta”, explica Lívia Silva, militante do movimento LGBT e Negro.
“É sempre lindo estar junto com gente de tantas partes do mundo. É uma missão nossa articular juntos um outro mundo, novos caminhos, novas caminhadas, novos rumos para a política no mundo, que cada vez enfrenta mais guerras, mais roubo de terras, mais ameaças contra quem vai contra essa situação”, afirma o artesão Jorge Muniz, da Argentina.
Mesmo com a forte presença na marcha de hoje de palavras de ordem contra o atual governo de Michel Temer, denuncias em relação ao golpe que destituiu a presidenta Dilma Rousseff e tenta impedir que o ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva se candidate a presidência esse ano, o grupo facilitador enfatiza que o Fórum está longe de ser um evento sobre política nacional. “O Fórum vai muito além de qualquer discussão sobre esquerda ou direita brasileira”, lembrou Mauri Cruz. “O Fórum Social Mundial é uma novidade na luta popular histórica brasileira, latino-americana e mundial. Temos muitos movimentos que lutam por outro mundo possível, mas muitas vezes cada uma na sua causa. E o Fórum inova ao tentar construir uma metodologia onde a gente, apesar dessa diversidade, decide um período, um lugar e um lema para gente se juntar e tentar construir estratégias comuns para tentar enfrentar esse sistema que não atende a humanidade”, ponderou Cruz.