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O que acontece quando um grupo plural, diverso e comprometido com a causa da educação se reúne para pensar o futuro do setor no país? Surgem propostas de cenários que apontam oportunidades, riscos e desafios para a Educação Básica brasileira.

Pelo menos foi o que mostrou uma experiência liderada pelo Reos Partners, com apoio de organizações atuantes na área da educação. Chamada de “ Cenários Transformadores para a Educação Básica no Brasil”, a iniciativa contou com o apoio do GIFE, da Ação Educativa, da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), do Todos Pela Educação e da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime). Juntos, eles formaram o “Grupo Convocador”, que articulou outros agentes para atuar no projeto.

A ideia foi pensar, orientado por uma metodologia inovadora, possíveis futuros da Educação Básica brasileira nos próximos 17 anos. Atuaram no processo representantes de diversos segmentos do campo: movimentos e organizações sociais, organismos internacionais, governo, institutos e fundações empresariais, sindicatos, professores, diretores, pesquisadores, pais e estudantes. Ao todo, foram três oficinas com um grupo que envolveu 41 convidados, mais 71 entrevistas com outros especialistas.

Os objetivos do trabalho foram aprofundar o entendimento sobre o tema, oferecer nova linguagem para análises, fortalecer relacionamentos, inspirar ações e, sobretudo, contribuir, enriquecer e estimular o debate público sobre a Educação Básica brasileira. Os critérios adotados buscaram ser relevantes, desafiadores, plausíveis e claros.

Após mais de um ano e meio de trabalho, o resultado é um estudo – lançado no dia 20 de agosto, em São Paulo – que aponta quatro cenários distintos pautados em um conjunto de tendências, baseadas na experiência dos envolvidos. Não, necessariamente, se tratam de quatro agendas. São quatro possibilidades de futuro que não devem se implementar em sua concretude, mas sim se integrar no desenho de futuro.

Nesse sentido, a régua aponta para 2032, ano do centenário do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, um movimento progressista proposto por educadores em 1932. Cleuza Rodrigues Repulho, presidenta da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), lembrou a riqueza do processo e a diversidade de perfis entre todos os envolvidos. “O ideal pelo direito à educação pública de qualidade para todos é o que nos une.”

Denise Carreira, coordenadora da área de educação da Ação Educativa, comenta a importância da iniciativa. “Com base nessa contribuição, nossa expectativa é que muitas outras discussões surjam, que se amplie a roda de debates sobre a educação como direito humano e como enfrentamento das desigualdades brasileiras.”

Para Christel Scholten, sócia do Reos Partners, o trabalho está apenas começando. “Esse lançamento fecha a fase de construção. Agora está na mão da sociedade, das pessoas comprometidas com essa agenda, ajudar a fortalecer o debate em torno dos cenários para a educação básica no Brasil.”

Foram parceiros financiadores dessa iniciativa o Instituto C&A, a Fundação Telefônica Vivo, a Fundação Itaú Social, o Instituto Unibanco e a Ação Educativa.

Processo de criação

Entre os participantes do processo, dois estudantes contam como foi o envolvimento com o tema e se orgulham de ter feito parte desse projeto tão relevante para o campo da educação no Brasil.

“Estou envolvida nesse projeto há um ano e tem sido muito importante para mim. Minha relação com a escola nunca foi fácil. Sofri violência, não gostava daquele lugar. Sentia a pressão por ser diferente. Aos poucos, fui descobrindo meu papel e acabei entrando para o conselho escolar. Com isso, em pouco tempo, já estava na militância por uma educação melhor. Por isso estou hoje aqui”, conta a estudante Iana Mallmann.

“Minha história é parecida com a da Iana. Transformamos a indignação em motivação. Acho muito estratégico esse estudo ser lançado justamente agora, logo após a aprovação da redução da maioridade penal na Câmara dos Deputados, no último dia 19. Não vamos desistir de lutar por uma educação emancipadora”, lembra o estudante Walisson Lopes.

Na opinião de Denise Carreira, coordenadora da área de educação da Ação Educativa, o resultado desse projeto é uma importante oportunidade de diálogo, em um momento em que direitos historicamente conquistados estão sendo desafiados no congresso. “Pouco após a aprovação do PNE [Plano Nacional da Educação], esse trabalho ganha ainda mais relevância.”

Construindo cenários

Os quatro cenários propostos ilustram histórias que descrevem possíveis caminhos rumo ao futuro e que ajudam a pensar a realidade brasileira. Não se tratam de previsões e nem de propostas. São projeções ilustrativas pautadas nas realidades que o presente nos mostra.

Para ilustrar e facilitar o entendimento dos cenários, o grupo usou uma analogia com a fauna brasileira. Dessa forma, os quatro desenhos foram batizados de Canário-da-Terra, Beija-Flor, Falcão Pelegrino e Tico-Tico. Cada um deles possui características específicas e aponta oportunidades, riscos e desafios para o futuro.

Daniel Cara, coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, explica que o cenário Canário-da-Terra se assemelha muito ao modelo educacional europeu, especificamente o dos países nórdicos. “Na realidade Brasil, ele expressa o espírito da constituição federal, do Plano Nacional da Educação e do processo de discussão da Conferência Nacional de Educação. Em suma, representa construções sociais e políticas recentes que garantem uma execução da educação como direito para todos.”

Anna Penido, diretora-executiva do Instituto Inspirare, explica o cenário Beija-Flor, uma visão bastante embebida de práticas educacionais mais contemporâneas. “Ele faz uma tentativa de imaginar o que ainda não é tão claro. Uma educação diferente, mais inovadora. Parte da premissa que o mundo de hoje é muito diferente, com um novo tipo de aluno, em contraponto ao modelo de educação vigente. Estamos falando de escolas diversas, de um modelo plural. Nesse sentido, o cenário também aponta para um risco de dispersão, sem uma política universal e uma gestão escalável.”

De acordo com Andre Degenszajn, secretário-geral do GIFE, o cenário Falcão Pelegrino é cheio de dicotomias. “Talvez esse seja o exemplo no qual a compreensão é mais fácil, por expressar um vetor que hoje é muito presente. A questão central é a expansão da presença do setor privado na educação básica, inclusive com financiamento público. Trata-se da predominância de um modelo de formação focado no mercado de trabalho. É uma projeção que abre oportunidades, como a questão tecnológica, por exemplo, mas que cria contradições por outro lado.”

André Luiz de Figueiredo Lázaro, representante da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais, comenta o cenário Tico-Tico. “Esse é o mais doloroso dos cenários, por apresentar poucas mudanças com relação ao que temos hoje, prevalecendo as mesmas tensões que ainda nos defrontamos atualmente na educação. Trata-se de um conjunto de práticas universalizantes, mas, que, em sua aplicação prática, não encontra a mesma vitalidade da teoria. É o exemplo do PNE: em sua concepção ele é excelente, mas em sua efetivação na prática a história é outra.”

Para entender os pormenores e as diversas situações e desafios que cada cenário apresenta, é preciso ler o relatório completo do estudo. O material está disponível no site:www.cenarioseducacao2032.org.br.

Fonte: GIFE

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