A Comissão Pastoral da Terra (CPT) publicou em recente relatório dados sobre a violência no campo no Brasil, entre o período de 1985 e 2013. Intitulada “Assassinatos e Julgamentos”, a pesquisa revela que, dos 1.270 casos de homicídios registrados no país durante esse período, menos de 10% foram a julgamento, com 28 mandantes e 86 executores condenados. As mortes de 1.680 vítimas, com apenas 108 julgamentos realizados, sinalizam a impunidade do sistema brasileiro.
Para o advogado da CPT em Marabá, José Afonso Batista, em entrevista à Adital, os dados atestam a falência dos órgãos da justiça quando se trata de apurar a responsabilidade dos crimes praticados contra as populações camponesas. “Esse estado de impunidade estimula a continuidade da violência. Quem decide pela morte de alguém (mandante) e quem assina o contrato da execução (pistoleiro), quando beneficiado pela impunidade, continuará pensando que o crime compensa”.
Batista avalia que a permanência da violência no campo no Brasil está associada a algumas causas, entre elas a concentração da terra, a ausência de uma política de reforma agrária e o modelo de desenvolvimento imposto para o campo, que acaba privilegiando o agronegócio e marginalizando os agricultores familiares, sem terra, indígenas, comunidades tradicionais. A impunidade dos crimes praticados contra os camponeses e suas lideranças e contra o meio ambiente também contribui para que se perdure a violência.
Na região Centro-Oeste, o Mato Grosso é o estado com maior número de vítimas fatais (119). Dos 76 casos registrados, apenas três foram a julgamento, com a condenação de um mandante. A região Sul foi a de menor ocorrência registrada, com 66 casos, oito julgamentos e oito condenados. Na região Sudeste, foram registradas 158 mortes, 34 julgamentos e 30 condenados. Minas Gerais é o estado que mais julgou e condenou os responsáveis pelos homicídios no campo ocorridos no país. Dos 68 casos registrados (em um total de 89 vítimas fatais), 25 foram a julgamento, o que representa um índice de 36,7%; 26 pessoas foram condenadas.
De acordo com o Censo Agropecuário de 2006 do Instituto Brasileiro de Estatística (IBGE), o Brasil ainda apresenta uma estrutura agrária concentrada. Foram identificados 4.367.902 estabelecimentos de agricultores familiares, o que representa 84,4% dos estabelecimentos brasileiros. Este contingente de agricultores familiares ocupa uma área de 80,25 milhões de hectares, ou seja, 24,3% da área ocupada pelos estabelecimentos agropecuários brasileiros. Os estabelecimentos não familiares, apesar de representarem 15,6% do total dos estabelecimentos, abrangem 75,7% da área ocupada. A área média dos estabelecimentos familiares é de 18,37 hectares, e a dos não familiares, de 309,18 hectares.
Batista aponta como medidas para atenuar o atual quadro de violência no campo: reconfigurar a estrutura agrária brasileira através de políticas de democratização do acesso à terra; priorizar investimentos na agricultura familiar, demarcar as terras indígenas, de ribeirinhas e quilombolas; ampliar e fiscalizar as áreas de preservação ambiental, unidades de conservação e alterar o atual modelo de desenvolvimento rural centrado na grande propriedade e no agronegócio. “Mais do que atuar na repressão de todos os crimes, apurando e condenando todos os envolvidos, é preciso enfrentar as causas que geram a violência.”, conclui o advogado.
Fonte: Adital