A situação das prisões na América Latina, em geral, tende a se agravar em função do uso indiscriminado do recurso do cárcere, afirma Gustavo Plat, integrante do Centro de Estudos Legais e Sociais (CELS) da Argentina. Ele participou, na última sexta-feira, 02 de outubro, do I Seminário Internacional de Pesquisa em Prisão, realizado em São Paulo, no marco dos 23 anos do Massacre do Carandiru.
Segundo Gustavo, o recurso do cárcere tem sido amplamente utilizado através de prisões preventivas ou de reformas legais, que visam a aumentar as penas, o que acaba refletindo em uma maior violência também no âmbitos de trabalho, desempenho e de desenvolvimento social, estendendo-se às comunidades e famílias. De acordo com ele, Cuba e Brasil são os países que apresentam as taxas mais elevadas de presos por grupos de 100 mil habitantes na região.
“O principal desafio é como exibir os efeitos nocivos dessa política e como intervir de uma maneira que tenha incidência para mudar o rumo desses critérios que, definitivamente, não conduzem a nada de bom, só geram mais violência, dentro e fora da prisão. Então, o desafio passa por como demonstrar ou como persuadir atores políticos ou atores sociais sobre a inconveniência dessa política”, analisa.
Memória, massacre e tortura
Relembrando o Massacre do Carandiru, que completou 23 anos, também na sexta-feira, 02, os participantes do Seminário falaram sobre o combate à tortura e a responsabilidade do Estado no que diz respeito ao encarceramento. Neste sentido, Camila Nunes Dias, professora e pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV/USP), ressalta que várias entidades, como organizações e conselhos, comitês de Direitos Humanos, ONGs e outros grupos atuam para fazer o controle da violência nas prisões. Porém, a “falta de articulação” e a realização de um trabalho “meramente burocrático” acabam não surtindo o efeito esperado, ocasionando a ausência de denúncias e críticas para a melhoria do sistema carcerário que, segundo ela, é “caótico e desastroso”.
“As autoridades brasileiras não se sentem constrangidas a darem uma explicação. Um exemplo disso é o Massacre do Carandiru e a população que apoia essa violência prisional”, comentou Camila.
O I Seminário Internacional de Pesquisa em Prisão é uma realização da Associação Nacional de Direitos Humanos, Pesquisa e Pós-Graduação (Andhep) em parceria com outras entidades de estudo e pesquisa, e teve como objetivo fortalecer a pesquisa e o debate em torno do problema carcerário no Brasil e na América Latina.
De acordo com Guilherme de Almeida, um dos coordenadores do evento, a iniciativa surgiu a partir do projeto de construção do site Massacre Carandiru (www.massacrecarandiru.org.br), que reúne pesquisa, notícias e dados sobre a ação da polícia militar, que deixou, no mínimo, 111 mortos na Casa de Detenção de São Paulo, mais conhecida como Carandiru, em 1992.
Segundo ele, duas condições principais contribuem para que atos ligados ao Massacre continuem presentes na realidade prisional do país: a superpopulação e violência policial. “O Carandiru representa um arquétipo de direitos humanos no Brasil. A política de esquecimento é central, porque, ao se esquecer, se está condenado a repetir o ato. A ineficiência do julgamento do caso também é uma questão que soma e torna importante relembrar o Massacre”, justifica.
O evento fez parte da “Semana de Lutas contra a Violência do Estado”, concluída no último sábado, 03, em São Paulo.
Fonte: Adital